sexta-feira, outubro 28, 2005

O meu Irmão está às portas de outra vida

O meu Irmão está às portas da nossa morte, cansado, exangue, débil, tão frágil. Os olhos mortiços e baços, semiabertos ou semicerrados... não sei dizer, como não sei se o copo que tenho à frente está meio cheio ou meio vazio. A membrana ocular que recobre a córnea oculta aqueles olhos tão ternos, tão generosos e castos. O meu amorável Irmão está prestes a repousar a derradeira redenção dos afáveis. Sinto próximo o dia glacial em que não mais poderei sentir o seu encosto dorsal junto às canelas e à barriga das pernas assim que boto o pé em casa. Até do mau hálito vou ter saudades; de, com um simples gesto de braço, me fazer entender amplamente sem precisar de dizer nada - além de que o meu Irmão ensurdeceu há já talvez um ano ou mais. Está deitado agora. Não come nem bebe. Apenas ulula de tempo em tempo porque está em contínuo sofrimento. O que sente, não sei. Imagino, por várias razões, que sinta dores de barriga, cólicas violentas. Penso nele e preparo uma tristeza amenizada pelo carinho que lhe posso transmitir ainda - não previno a tristeza nem a esconjuro; ofereço-lha como tributo. Serão muitas e inesquecíveis as recordações do meu Irmão, que uivava num mimetismo quase verbal o meu nome verdadeiro... «huuuuug». Então, sem réquiem, sem cerimonial trágico nem latim, passei parte desta noite ora junto dele, ora pensando nele. Se nunca viram um cão viver 16 anos felizes, eu vivi 16 anos felizes com um cão. Chama-se Fidji. Ainda.

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1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

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sábado, julho 22, 2006 6:27:00 da tarde  

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