terça-feira, abril 26, 2005

27

(Dou por finda a nova escrita.
Deixo-te a mexer nos teus cabelos.
Estou na terra batida a dilatar ao sol.
Sou a mola que te prendeu o cabelo
entre duas pedras e muita poeira.)

Só me faço em passatempo,
invertendo o que é constante,
como um perpétuo movimento,
do guitarrista, a mão cantante.
Daqui já nada se espreme,
mas do sumo a casca fica;
o retorno à terra não teme,
e morrendo, morre renascida.
Sou um segredo de alquimia,
entregue curioso do acaso;
provocarei efervescência,
se me deres o teu abraço.
Salvé tempo, passa vivo,
corre estreito, a direito;
labirinto, sou passivo,
empurrado sempre a eito.
Salvé tempo, salvé estrada,
corro lenta a caminhada,
depois de o prazer ter deixado,
em troca, perfeição transfigurada.
Breve, sem retorno, um passado;
no mar, uma jangada.
A mensagem, esta, na garrafa atirada.
Conclusão de um naufrágio,
descoberta a maresia,
enjoo de saber não ser marinheiro;
não concluída profecia.
Sou o restante, sou o náufrago,
sou o cão atropelado;
sou o contra e o análogo,
sou um príncipe desfigurado,
outrora belo e encantado.
Nobreza humilhada,
vestido de noiva espezinhado;
arroz de pólvora em forma de aura;
um pobre homem, rico outrora.
Sou o ícone do desuso,
a espada embainhada,
um museu e eu recluso
na partida e na chegada.
Sou o excesso aproveitado,
resto da mesa borda fora;
prato, migalha, cozinhado,
refeição fora de hora.
Sou apenas o caroço,
e mesmo isso mais não seja.
Trago-te presa, espinha ao pescoço,
de já ter sido a cereja.

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