Jorge Palma no CCB - Primeira noite, 5ª feira
O grande auditório estava quase repleto. Pessoas de todas as idades compunham a sala. À esquerda do palco, na perspectiva da plateia, o último artista. Todo um espaço que se prolongava por diante, ocupado pelo corpulento piano de cauda preto, dirigia o olhar como uma linha de força de composição estética para a banda. Sob a mesma lógica de perspectiva, da nossa esquerda para a direita, Marco Nunes (guitarrista de Blind Zero), Miguel Barros (baixista de Zen), André Hollanda (também baterista de ZEN) e Miguel Ferreira (teclista de Clã) perfaziam a comitiva de palco desta noite, que também acompanhou o Jorge no seu último álbum, "Norte". Sensivelmente a meio, juntou-se-lhes Vicente Palma, filho de Jorge. Abraçaram-se. Foi bonito. A banda deixou-os a sós. Tocaram guitarra e cantaram lado a lado. Se para fruir e semear a vida há que plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho, este senhor já lá esteve. Já desbundou. Vicente saiu com nova entrada da banda, mas para voltar daí em breve. Desta feita, tocou piano. Ao que sei, é esse o seu instrumento dilecto. Não poderei comentar de todo o início do concerto, essencialmente porque, desta vez, atrasei-me mais do que o próprio Jorge, que chegou "quase" a horas (deve ter sido pr'aí meia-hora de atraso - começava às 21h). O concerto foi bom. Tocou-se um pouco de tudo, com predominância de "Norte". O encore foi generoso. Quando cheguei, o auditório estava muito sossegado e ordeiro, composto simetricamente pelas demasiadamente confortáveis cadeiras almofadadas, apesar de, então, se ouvir "Dormia Tão Sossegada", título que não sugere de todo o andamento da música. Mas tenho algumas saudades do poder, do "muro de som"(*) dos tempos de "Palma's Gang", pelo menos neste formato de "banda". Kalu e Flak - ok, Zé Pedro e Alex também - assentam como uma luva no registo rock, sujo (numa perspectiva um tanto grungie) e impetuoso, mas dinâmico, com espaço para laivos de classicismo e sombras de silêncio, que se ouvem ainda como ecos poderosos que ressoam do inexistente Johnny Guitar. Pensei que, se a oportunidade fosse agarrada com unhas e dentes; alma e coração, os Jimdungo poderiam ter sido banda para dar esse kick de que algum do reportório precisa. Tinham a essência e, arrisco dizer, também a fórmula. Mas o Jorge também é um wandering spirit com um organismo resistente, para quem nem todas as fórmulas fazem sentido. Imprevisibilidade. Também está bem assim, com estes rapazes. O tempo vive-se lentamente. Melhor: O tempo vive-se a seu tempo. O que existe é o presente e não há dois gestos iguais. Interessa é que o Jorge se mantenha feliz, a tocar, e, muito importante, a gravar discos; deixar obra feita. Já hoje, sexta-feira, há mais. De novo no CCB. A música e o preço dos bilhetes são consumer friendly. 10 euros para um fim de dia muito agradável. A companhia também não deixou a desejar.
(*) Wall of Sound: Conceito de Phil Spector, produtor revolucionário da década de 60, que consistia em dobrar determinadas pistas de som (instrumentos ou vozes).
Etiquetas: Música, Prosas Cordianas, Quotidianos
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