"Jorge Palma, O artista português", Parte 1 (Entrevista integral, uncut, ao jornal Impress, 2003)
Na infância, o teu brinquedo foi um piano. Começaste a ter aulas aos seis anos. Aluno de vintes na primária, seguiu-se o “descalabro” no Liceu Camões e, consequentemente, o colégio interno. Eras um miúdo meio revoltado?
J.P. – Eu não diria revoltado, eu diria rebelde, inconformista ou... epá...
A que é que se isso se devia?
J.P. – Era um miúdo com... havia uma série de coisas de que eu não gostava, a sociedade em que se vivia era uma... portanto, havia uma repressão e opressão, sentia-se a opressão, uma sociedade muito antiquada, conservadora. Há sociedades conservadoras que não são necessariamente retrógradas, ou seja, conservam os seus valores e têm brio na tradição e não sei quê... No nosso caso era uma estagnação pura e simples, era um país cinzento, o ensino, a educação, tudo era desconfortável, desagradável e, portanto, é natural que um miúdo de dez ou onze anos, que vai para o liceu, começa a conhecer os amigos, uns mais vivos que outros, mais vivaços... e eu tinha tendência para alinhar com os mais vivaços, não é? (risos)
Nunca tiveste no horizonte o curso, seguir os estudos?
J.P. – Não, era um dado adquirido. Era uma coisa que nem sequer dava para eu me interrogar ou pôr em causa porque estava decidido que eu acabava o liceu e depois ia para a Universidade e, não sei porquê, mas o pessoal - o pessoal, quer dizer, a minha mãe, o meu pai, a família - achava que o menino tinha muito jeito para Engenharia Electrotécnica (risos), e eu, “tá bem, porque não, tudo bem”, lá porque sabia fazer umas ligações e tinha apanhado uns choques, desmontado uns brinquedos e voltado a montá-los e não sei quê... Depois sobravam sempre peças mas... pronto, foi uma coisa que eu naturalmente segui. Por exemplo, quando acabo o quinto ano e é preciso decidir se vou para letras ou ciências, naturalmente fui para ciências porque ia ser engenheiro. Se calhar, se tivesse pensado, fazia mais sentido ir para letras. Como no fundo havia uma relação com a música, que se manteve desde sempre, tão espontânea, tão natural, acho que nunca pus em causa que a música faria parte da minha vida, que eu iria sempre funcionar com a música. Tirar um curso paralelo, tudo bem! E mesmo assim ainda fui até ao segundo ano, mas então houve uma série de mudanças políticas, uma grande agitação estudantil, eu comecei a ganhar o primeiro dinheiro - aliás, o primeiro dinheiro foi ainda com as bandas -, mas comecei a ganhar dinheiro a solo, portanto, a fazer orquestrações, gravei o primeiro disco (single)...
Como é que tu conseguiste...
J.P. - Comecei a perceber que dava para sobreviver com a música e cada vez mais...
Conhecias pessoas...
J.P. – Sim, era um meio pequeno... eu conheci os músicos praticamente todos, de Lisboa, Porto, Algarve...
Paravam todos nalgum sítio? Vá-Vá?
J.P. – O Vá-Vá, por exemplo, era um sítio de referência.
Os “Sheiks”?
J.P. – Os “Sheiks”...
Que te levaram ao Ary dos Santos...
J.P. – Exacto, o Fernando Tordo foi quem me deu o telefone do Ary... mas conhecíamos todo o pessoal. No primeiro festival de Vilar de Mouros, estive lá com a minha banda e toda a gente se conhecia.
A tua banda era o Sindikato...
J.P. – Sim. A gente tocava sobretudo covers.
Mas eram conhecidos, já na altura...
J.P. – Éramos conhecidos sobretudo no meio estudantil. Fazíamos as festas dos liceus e... fartámo-nos de tocar.
Em álbuns como o “´Té Já”, de ´77, reuniste uma série de músicos de calibre... Rão Kyao, Júlio Pereira, Armindo...
J.P. – O Armindo gravou bastante comigo.
Tu conhecia-los todos ou era a editora que...
J.P. – A gente conhecia-se. Por exemplo, se eu precisava de um Hammond - um órgão que quase não havia em Portugal -, o Zé Cid, que tinha um, emprestou-mo várias vezes. Havia no Porto também o Miguel Graça Moura (maestro). Esse era um dos que tinham um Hammond também. Eram raros os que existiam em Portugal. Mas havia um intercâmbio... Haviam os Vox também...
J.P. – Eu não diria revoltado, eu diria rebelde, inconformista ou... epá...
A que é que se isso se devia?
J.P. – Era um miúdo com... havia uma série de coisas de que eu não gostava, a sociedade em que se vivia era uma... portanto, havia uma repressão e opressão, sentia-se a opressão, uma sociedade muito antiquada, conservadora. Há sociedades conservadoras que não são necessariamente retrógradas, ou seja, conservam os seus valores e têm brio na tradição e não sei quê... No nosso caso era uma estagnação pura e simples, era um país cinzento, o ensino, a educação, tudo era desconfortável, desagradável e, portanto, é natural que um miúdo de dez ou onze anos, que vai para o liceu, começa a conhecer os amigos, uns mais vivos que outros, mais vivaços... e eu tinha tendência para alinhar com os mais vivaços, não é? (risos)
Nunca tiveste no horizonte o curso, seguir os estudos?
J.P. – Não, era um dado adquirido. Era uma coisa que nem sequer dava para eu me interrogar ou pôr em causa porque estava decidido que eu acabava o liceu e depois ia para a Universidade e, não sei porquê, mas o pessoal - o pessoal, quer dizer, a minha mãe, o meu pai, a família - achava que o menino tinha muito jeito para Engenharia Electrotécnica (risos), e eu, “tá bem, porque não, tudo bem”, lá porque sabia fazer umas ligações e tinha apanhado uns choques, desmontado uns brinquedos e voltado a montá-los e não sei quê... Depois sobravam sempre peças mas... pronto, foi uma coisa que eu naturalmente segui. Por exemplo, quando acabo o quinto ano e é preciso decidir se vou para letras ou ciências, naturalmente fui para ciências porque ia ser engenheiro. Se calhar, se tivesse pensado, fazia mais sentido ir para letras. Como no fundo havia uma relação com a música, que se manteve desde sempre, tão espontânea, tão natural, acho que nunca pus em causa que a música faria parte da minha vida, que eu iria sempre funcionar com a música. Tirar um curso paralelo, tudo bem! E mesmo assim ainda fui até ao segundo ano, mas então houve uma série de mudanças políticas, uma grande agitação estudantil, eu comecei a ganhar o primeiro dinheiro - aliás, o primeiro dinheiro foi ainda com as bandas -, mas comecei a ganhar dinheiro a solo, portanto, a fazer orquestrações, gravei o primeiro disco (single)...
Como é que tu conseguiste...
J.P. - Comecei a perceber que dava para sobreviver com a música e cada vez mais...
Conhecias pessoas...
J.P. – Sim, era um meio pequeno... eu conheci os músicos praticamente todos, de Lisboa, Porto, Algarve...
Paravam todos nalgum sítio? Vá-Vá?
J.P. – O Vá-Vá, por exemplo, era um sítio de referência.
Os “Sheiks”?
J.P. – Os “Sheiks”...
Que te levaram ao Ary dos Santos...
J.P. – Exacto, o Fernando Tordo foi quem me deu o telefone do Ary... mas conhecíamos todo o pessoal. No primeiro festival de Vilar de Mouros, estive lá com a minha banda e toda a gente se conhecia.
A tua banda era o Sindikato...
J.P. – Sim. A gente tocava sobretudo covers.
Mas eram conhecidos, já na altura...
J.P. – Éramos conhecidos sobretudo no meio estudantil. Fazíamos as festas dos liceus e... fartámo-nos de tocar.
Em álbuns como o “´Té Já”, de ´77, reuniste uma série de músicos de calibre... Rão Kyao, Júlio Pereira, Armindo...
J.P. – O Armindo gravou bastante comigo.
Tu conhecia-los todos ou era a editora que...
J.P. – A gente conhecia-se. Por exemplo, se eu precisava de um Hammond - um órgão que quase não havia em Portugal -, o Zé Cid, que tinha um, emprestou-mo várias vezes. Havia no Porto também o Miguel Graça Moura (maestro). Esse era um dos que tinham um Hammond também. Eram raros os que existiam em Portugal. Mas havia um intercâmbio... Haviam os Vox também...
Brevemente, a Parte 2. Não perca os próximos capítulos.
Etiquetas: Imagens e Afins, Jorge Palma - Entrevista integral ao jornal Impress
2 Comments:
:)
Abraço
Johnny
fui
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»
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