Há algum tempo atrás referi numa «conversa escrita» muito pessoal, a um amigo, que «não deixo as minhas palavras serem expulsas livremente. Porque não merece a pena, porque não são suficientes, porque me vejo autista, porque são impróprias, porque se tornam duras como rocha. São filhos indesejados, prendo-as, e com elas o que trazem, em cadernos negros. A possibilidade de alguém as ler faz com que elas se desarticulem todas quando saem para o papel. Parece que umas invadem as outras, que lutam, se comem, e o resultado é a perversão. Do que deixei por dizer, do que disse e retorci, não obstante no segundo em que escrevo me pareça, realmente, que são transparentes, que não deixam dúvidas, espelhos. As dos outros, dos livros, atenuam-me a deficiência! É como se pudesse fazer delas as minhas por momentos e sem mais, de modo claro, sentir que perfeita, cristalinamente, aquilo e só aquilo é o que sinto ou penso, o que queria dizer. A isto me referia. Como explicar o que não quero dizer, se digo? Honni soit qui mal y pense?»
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Há algum tempo atrás referi numa «conversa escrita» muito pessoal, a um amigo, que «não deixo as minhas palavras serem expulsas livremente. Porque não merece a pena, porque não são suficientes, porque me vejo autista, porque são impróprias, porque se tornam duras como rocha.
São filhos indesejados, prendo-as, e com elas o que trazem, em cadernos negros. A possibilidade de alguém as ler faz com que elas se desarticulem todas quando saem para o papel. Parece que umas invadem as outras, que lutam, se comem, e o resultado é a perversão. Do que deixei por dizer, do que disse e retorci, não obstante no segundo em que escrevo me pareça, realmente, que são transparentes, que não deixam dúvidas, espelhos.
As dos outros, dos livros, atenuam-me a deficiência! É como se pudesse fazer delas as minhas por momentos e sem mais, de modo claro, sentir que perfeita, cristalinamente, aquilo e só aquilo é o que sinto ou penso, o que queria dizer.
A isto me referia. Como explicar o que não quero dizer, se digo? Honni soit qui mal y pense?»
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