terça-feira, novembro 11, 2025

Elegia do Desígnio

A era expirou; o mar levou o farol.
O código herdou o sopro do criador.
A pátria jaz, funerária, sob o lençol
– a silhueta no sudário do censor.

Velha bandeira, mortalha de poeira,
o falso profeta monetiza a capela;
a democracia é vitrina de algibeira
num púlpito em que o ódio é sentinela.

Havia um tempo aceso, de lampejo,
da palavra a fitar a cobardia.
O homem rendeu-se à usura do desejo,
à verdade conscrita à demagogia.

O amor, finalmente, feito transação
– cruz de néon num registo civil,
esperança possível em promoção
no código frio de um milagre útil.

Marcha a procissão em silente nudez.
Nada como a fome ensina a esperar.
O verbo morde a língua da lucidez
e o povo aplaude o algoz por se salvar.

Ó plebeus da renúncia, onde estais,
que deixais as hordas invasoras
nas tribunas grunhir como animais?
Quem elegeu tantos facínoras?

Um fósforo reacende um templo de luz
e a gente desperta — renasce em lume.
A míngua recusa o silêncio que a reduz.
De archote em punho, rompemos o negrume.

Do fogo à palavra eis a verdade:
Aqui jaz o medo, respira a razão;
reaprende o desígnio a vontade.
Sob a pele, o chão: a refundação.

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