domingo, setembro 08, 2024

Infinito



Tempos houve de infinito,
uma fracção de segundo
condensando toda a matéria,
passado, presente e futuro,
fusão comprimida de cristais
onde já nos encontrávamos,
e mil gatos, areias e mares antigos.
Houve explosões, expansões, reacções
e a remota improbabilidade
de que o primeiro rio, o primeiro sismo,
tenham feito rolar a primeira pedra,
cumprindo o curso exacto
de formas prometidas
e eventos necessários
para que aqui estejamos nós,
em Milfontes, tecendo presente,
moldando futuro, segurando infinito.


Julho de 2024

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quarta-feira, maio 22, 2024

Deus Está na Chuva



Deus está na chuva,
no fumo ondulante do cigarro,
formando sombras espectrais,
rostos de sereias e corpos de amantes,
antílopes que brincam na casa do lago,
sem medo e sem pressa,
onde a morte por desventura
seja apenas mito, promessa.

Severin espera-te lá,
onde não há coincidências,
onde cada bala apanhada com os dentes
seja a ilusão que desmente
a morte imaginada.

São gomos de areia molhada
os pés que pisaste, bem-me-quer desfolhado,
no olhar assustado que me lançaste.
Dizem que bebeste a solidão,
que escorreste a garrafa que repousa
em estilhaços, como tu, no chão.
Bendito esquimó que não conhecia
a Deus, pecado ou religião.

Invento mentiras para contar a Verdade.
Deus está na casa do lago,
nas sombras que se desvanecem,
nos sonhos que nunca adormecem
e na vida que, sem desventura,
após a morte eternamente floresce.

N. do A. – Poema composto a partir da reescrita do poema “Ficção”, redigido em Maio de 2009 e publicado em 2012 no livro “Sétima-Feira”, e da letra de uma velha canção, tirulada “Areias de Júpiter”, que nunca chegou a ser gravada. “Ficção” fora dedicado a Kurt Cobain, em parte inspirado por Velvet Underground.

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Mais que Eternidade

Atravessas a sacra via dos corredores do tempo,
melodia transformada em saudade e cântico.
É preciso cantar-te às pedras que não clamem por nós,
é preciso largar um dilúvio que se estanque na pauta,
esquecida sob o tampo da partitura do silêncio,
ao resgate do milagre, da simplicidade mundana,
da descoberta sagrada e da existência profana.
A vida é sempre a perder, mas a música é eterna.

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segunda-feira, março 11, 2024

Feliz Agora (Porra!)

DAQUI



Sucedem-se sombras em cadência rápida
e o verso flui na ponta da escrita automática,
corrente como água sem ter para onde.
Na dança acelerada de dias alados,
de clepsidras arenosas como rios secos
e de consumos vorazes em vitrinas expostos,
a vida, subtil, verte-se entre dedos, sabemos
- palco de ilusões, espetáculo frenético
de música apressada e caos poético.
Desumanizado, excedente, o consumidor
perde a essência do gosto, perde o sabor,
despreza lamentos em caligrafia lenta
e versos que abraçam partidas impossíveis.
Num portal para nenhures um poeta sem choro
rascunha a efemeridade de ilusões adiadas.
Num beco urbano um palhaço plange e soluça.
Conhece uma jovem. Ela dá-lhe um arco-íris.

Ideias brilhantes, verdadeiramente geniais,
trariam fama, fortuna e glória se bem executadas,
mas a perícia sensível do virtuoso está muito desvalorizada
perante a tirania do limiar da pobreza
e do trabalho pela sobrevivência,
e não poderíamos ter todos fama, fortuna e glória.
São precisos inúmeros pobres para fazer um rico
e demasiados amenistas para carregar um líder.
Estupendas são as corrupções políticas,
os escândalos financeiros e o chico-espertismo,
mas não chegam para vomitarmos à mesa diante da televisão.
Afinal, eles são da nossa cepa, são os que se chegam à frente,
oportunistas vaidosos, munidos de bandeirolas, panfletos e bonés.

Passez à-la-caisse! Passez à-la-caisse!

A Pessoa, o poeta, cheirava a tinta fresca de tipografia…
Hossanas a quem conhecer o cheiro de cartazes
recentemente impressos, colados a pincel,
e a quem, dentro de pouco tempo,
souber como se folheia um jornal;
como se conduz um camião TIR;
como se atende um cliente a sorrir.
Os armamentos gloriosamente mortíferos
ainda não acabaram connosco de vez.
Ouvi dizer que somos do interesse de extraterrestres.
Mas tudo é vida fascinante, até nas montras brilhantes
com dons curativos de afeções de alma
e de espíritos voluptuosamente errantes,
ainda sabendo que os astros são os mesmos
que inspiraram os mestres de Da Vinci
e que o Sol é o próprio que tisnou Cleópatra.

Ah, e as vidas complexas da gente que aos andaimes sobe
sem outro fito que não a gente que à braguilha desce.
A indigência moral não assenta aos perdedores,
àqueles que, destroçados, desistiram de competir,
incapazes de depredar, derrotar, conquistar ou subjugar;
incapazes sequer de lutar pelo pão na mesa,
de limpar o suor nas mangas estiradas sobre os pulsos,
no entanto sujas de ranho e resíduos alimentares.
A luz do Sol abafa o silêncio das imitações de vida
de pobres, ricos e remediados, das bocas suturadas,
e havemos todos de morrer sem dar por nada.
Cá preciso de Liberdade para depois de velho ou morto.
A vida é mais custosa do que a vida que temos para dar;
é um recurso tão escasso quanto urgente, antes que morra,
e eu só tenho uma certeza: quero ser feliz agora, porra.

Dedicado a José Mário Branco e Fernando Pessoa

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terça-feira, março 05, 2024

Primado Aristotélico

DAQUI










Se buscas algo que pretendes possuir,
cresce o vazio do que te falta,
és outro.
Pelo que não tens, definhas.
Pelo que não és, renasces
como renascem os dias,
Lua após Lua, Sol após Sol,
reconhecendo a fatalidade do destino,
mas ignorando o itinerário da viagem.
Terás aceitado viver
para seres aceite? 
Terás entregado os pontos
para não seres entregue?
Terás matado a sede
para não seres morto?
Ser ou ter?
Ser ou não ser?
Propósito, identidade, realização.
É tua a conjugação.
O verbo define a narrativa
das biografias, da vida.

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sábado, março 02, 2024

Liberdade É Escrever Poemas

DAQUI
Havia crianças radiantes de sorrisos abertos,
olhos brilhantes e sonhadores, despertos.
Impecavelmente alimentadas e vestidas,
corriam para a vida sem ideias preconcebidas.

Cresciam num mundo livre de ódio e racismo,
fome, desigualdade, desperdício e classismo
- palavras desconhecidas, caídas em desuso,
lembradas na História de tempos obusos.

Nada havia senão paz e harmonia,
auroras de Liberdade e alegria,
Liberdade de pensar e de saber,
Liberdade de viver e de morrer.

Nada havia senão contentamento
conformado com a inevitabilidade
da dor, da perda e do tempo,
da insaciabilidade do Amor e da Liberdade.

Havia alvoradas que rompiam em sinfonia
alinhando a Este a Lua e a estrela d’Alva
num prenúncio solar de infinita sabedoria
que ao dia erudia corpos e almas.

Havia Liberdade com responsabilidade.
Liberdade...

Liberdade de ficar e de partir,
Liberdade de falar e de ouvir,
Liberdade do corpo e da mente,
de um voto verdadeiro e consciente.

Havia Liberdade de trabalhar e de brincar,
Liberdade de ganhar e de perder,
Liberdade de escolher e rejeitar, de sonhar
o que ainda não existia em nenhum lugar.

Havia Liberdade de dar e de partilhar,
Liberdade da servidão e da libertação,
Liberdade de acreditar e de orar,
Liberdade de ser numa canção.

-*-

Acordei aturdido desse sonho lindo,
perguntando-me se conhece a Liberdade
quem por herança lhe viu o poder transmitido
ou quem da prisão se liberta com temeridade.

Aquele que reina de berço e vagueia livre
não vislumbra o êxtase da libertação
do que nasceu acorrentado e vive
asfixiado para cantar a tal canção.

Pudessem os mestres da guerra extrair
de escravos ignorantes o ar dos pulmões;
pudessem eles os seus sonhos destruir
com o fogo de bombas e canhões.

Escondidos atrás de exércitos e muros,
sentados a secretárias opulentas,
ei-los altivos em mansões faraónicas, seguros
e legitimados para todos os crimes e violências.

A impunidade é um incentivo vicioso
que perverte irremediavelmente.
O corrompido ainda cobra à morte o preço
do juro tirano das almas de tanta gente.

O rosto do executor é sempre oculto.

Põe armas nas mãos de crianças,
agita o mundo como a um saco de gatos,
atiça ódios e acalenta vãs esperanças,
inventa doenças; rentabiliza os fármacos.

O rosto do executor é sempre oculto.
A Liberdade não virá do gume do medo.
O opressor permanecerá um vulto
movendo-se nos bastidores em segredo.

Resta-nos andar na contramão,
viver de remar contra a maré,
escrever canções de redenção,
depositar no outro a nossa fé,
passar o amarelo, falar na sala de aula
e provar o gosto de ser livre numa jaula.

Livre do medo da anarquia do destino,
mão firme e fria como a morte ao leme,
cumprindo-me desimpedido e libertino,
desobediente e rebelde, mas solene,
empunho o cravo e o caderno do poeta
que acabou morto na sarjeta.

E um voraz apetite infantil me diz da vida
que a cura para os males da Liberdade
é mais Liberdade ainda.

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quarta-feira, fevereiro 21, 2024

O Teu Tempo É Quando

"The Persistence of Memory", Salvador Dalí, 1931











Esquece-te do futuro!

Não adianta morrer.

A vida é uma ordem.

Aos ombros levas o mundo,

nos olhos guardas o mar

e nada esperas de ninguém.

A angústia define um tempo fundo

que tentas agrilhoar, deter

na pulsação de um poema.

 

Por que força, por que muro

podes o tempo suspender

em placidez suprema?

Nenhuma!, nenhum augúrio,

qualquer hipótese de prever

a negra sombra do dilema.

Tens mais passado que futuro

e sabes: o que estás a ser

é deixares de ser o que és.

 

Tiveste o mundo aos pés

quando nada tinhas

e todas as horas perdidas seriam ganhas

se na jarra da cozinha houvesse flores,

soubesses tu viver incauto,

alheio à voracidade do tempo.

 

Por que fica tarde tão cedo?

A noite é demasiado curta

se o tempo é para sempre.

Mas o tempo não existe, é segredo

guardado à dócil força bruta

na gestação longa de um ventre.

O tempo faz o vinho azedo,

mas também cura e transfigura,

nada perde, tudo transforma.

 

Todo o tempo é tempo de fazer o certo,

seja o tempo invenção da morte.

Não basta ir sendo numa cama morna.

O tempo não fez do longe perto

nem nos repisa à sorte

sobre a face da bigorna.

Anda em silêncio a orar no deserto,

regedor do céu e do inferno,

sob crepúsculos de asas pacientes.

 

Implacável, o tempo é presente

e nem perdoa a quem, num átimo de poesia,

conheceu a eternidade inteira num só dia.

Se o tempo remédio fosse, nenhum mal existiria.

Guerra, fome, a discussão lá na cimeira,

provam apenas que a vida prossegue como sempre.

Os imberbes tomam os velhos por tolos;

os velhos sabem que os imberbes o são.

 

Tempo de depuração.

Já te esqueceste do futuro?

Não adianta morrer.

A vida é uma ordem,

não uma saudade fotografada.

De manhã anoiteces,

pastor da madrugada,

de dia tardas

e de noite ardes pela alvorada.

O teu tempo é quando.

 

Para tudo há um momento,

e tempo para cada coisa sob o céu:

tempo de nascer e tempo de morrer;

tempo de plantar e tempo de colher. 


* A última estrofe, a itálico, traduz um excerto de "Turn! Turn! Turn!", dos Byrds, por sua vez uma canção original de Pete Seeger, cuja letra, excepto o título, repetido como refrão, e os dois versos finais, consiste na reprodução exacta dos primeiros oito versos do terceiro capítulo do livro bíblico de Eclesiastes.

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quarta-feira, fevereiro 14, 2024

A Escolha da Rosa

DAQUI








Ruas inacessíveis, becos sem saída,

incontáveis estradas bifurcadas.

Regressas à casa de partida,

dado a esperanças e encruzilhadas.


Quando as ilusões te salvam, meu menino,

predestinam a revelação dos teus segredos,

tendo a Lua por testemunha, iluminando-te o caminho,

deitando a teus pés, sobre a calçada, todos os medos.


Ali, duas estradas divergiam sob Sol candente

num momento imóvel e arrastado

que da paixão fez pressentimento

e abriu dois sulcos de um mesmo fado.


Não podias seguir por ambos,

mas a Roma dão todos os caminhos,

peregrinação de amantes sozinhos

que ao Amor conduzem desencantos.


Observaste o primeiro trilho:

desaparecia no horizonte,

serpenteante como um rastilho

a espoletar destino adiante.


Olhaste o segundo, vereda montanhosa

de subidas e descidas extenuantes,

e, ao fundo, uma única e serena rosa

decidiu por ti, num dramático instante.


Colhida a rosa, guardada húmida no bolso,

seguiste viagem, subiste e desceste,

caíste e duvidaste, temeste o impulso,

desejaste outro troço que não este.


Deste de beber à rosa pelo caminho,

junto à margem do rio, fio fino

de água entre estradas, traço azulino

que te saciou e levou ao destino.


Não podias esperar pela morte,

nem tua nem da flor

que entregaste à consorte

do teu destinado Amor.

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quinta-feira, fevereiro 08, 2024

Nove Dias por Semana

Sebastião Salgado, Serra Pelada Gold Mine, 1986











Eu sei ter uma faca cravada nas costas.
Incomoda-me a paz com que a carrego.
O pão empurra espinhas de magras postas.
Tenho emprego, apraz-me um prego.

Eu sei que a fome se entala na garganta
e se adormece fundo num colchão.
Sei trabalhar nove dias por semana
por direito escravo à habitação.

Eu sei ter a guerra a bater à porta,
a saudinha ameaçada, risco de extinção,
e sei nada saber do que importa.
Duvidar de tudo é a minha educação.

Guerra, fome, relento, doença, ignorância.
Ouço a ladainha desde a minha infância.
A paz, o pão, habitação, saúde, educação.
Bendito seja quem disso fez uma canção.

A Sérgio Godinho

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sábado, fevereiro 03, 2024

Diz-me que Sim

"Ceiling Painting/Yes Painting", Yoko Ono, 1966











Amaste como o luar ao meio-dia.
Sorrindo na cara do desgosto,
fizeste da fealdade beleza,
reflectindo-nos obliquamente,
espelhos eivados,
transfigurados na intersecção radiante
de um inextinguível nexus luminoso
num riacho de mosto.

Como é que se diz, mãe,
que foste com a cabeça entre as minhas mãos vagas,
que te chamei e pedi para ficares
quando já não estavas?
Como se diz que te ia murmurando ao ouvido,
que te implorava para não ires,
e já tinhas ido?
Como se diz, mãe, que estiveste 45 minutos
de vestes rasgadas e peito desnudo,
e eu só te largava a espaços, sem toque,
para o desfibrilhador te acometer em espasmos
e nenhum de nós recuperar do choque?

Nasceste tão doce para acabar num corpo asfixiado,
magro e seminu, lábios arroxeados,
incapaz de responder à minha súplica,
no chão prostrada, ao lado da cama,
sem poesia nem música
- um corpo de nada, sem chama -,
já tu planavas livre, olhando-me de cima.

Emergiste grácil desse corpo, estou certo,
vaporosa como as cinzas, mas eu guardei-te perto,
germinada num vaso, cantada em verso.
Como água para azeite, regada a preceito,
a oliveira das minhas raízes pende do parapeito
para alcançar céu aberto.
E os anjos, suspirantes numa frágua de amor
devoto como eu a clamar o teu nome, mãe
- porque mãe é o teu nome de santa -,
olhavam-nos com o mesmo nó na garganta
que de então me aperta a laringe também.

Celestial e bendita, lirial,
silenciaste por fim mágoas e dores.
Ter-te-ás feito de todas as cores
e dos meus ais roseiral,
que te sei alígera e ágil,
ainda que levasses daqui
todas as partes de mim
que sem ti nem eu sei.

Quando nasci o mundo eras tu,
a tua palavra era lei.
E agora, mãe?
A que mundo me dei?
Podes dizer que me vês?,
que ainda sou o menino dos três
que adormeceu nos teus olhos
de ternura sem fim?
Ainda oiço a tua voz:
“… O teu berço adornei
e o pus junto a mim…”
Diz-me que sim.

10 de Junho de 2021, Santarém. Foto: Ricardo Pinto

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domingo, julho 23, 2023

Espaço Negativo

René Magritte, La Décalcomanie, 1966











Se pintura não é a cor deixada ausente com harmoniosa intenção;
Se música não é o silêncio dramático que alicerça e precede o êxtase;
Se literatura não é a lacuna esfíngica que dá vazios a preencher de dúvida e emoção;
Se escultura não é a parte esculpida, removida, que provoca a emersão da forma;
Se o verbo omisso, compreensivo e transigente não é ação que transforma;
Se arquitectura não é o pátio amplo e despojado que sustenta o próprio firmamento,
Reneguem-se os conceitos, a estética, a arte, o amor, a ética
E oblitere-se a existência, a criação, o pensamento.
A omissão é presença. Em cada vazio há uma chance, uma crença.
Na beleza do que falta nada é negado, tudo é essência.

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sexta-feira, agosto 05, 2022

Funcionalismo

Um funcionário apagado e triste,
escondido e envergonhado,
esperando que não lhe dirijam palavra,
planta uma árvore no canteiro da varanda,
debruçada sobre a Estrada Nacional,
onde a luz solar resta ardente no asfalto,
sabendo de antemão que não lhe cabe a fruição
nem do fruto nem da sombra.

Débito e crédito debitado;
toda uma vida de empregado,
operário pontual e exemplar
sem orgulho no cumprimento de um dever
e sem sombra nem fruto,
irremediavelmente cansado,
sem presente e sem futuro.

Como a natureza, trabalha
continuamente e em silêncio,
absorto e conformado,
canário mudo na gaiola,
alimentado a alpista,
no labor desditoso do desejo
único de esquecer-se quem é;
na lida de tudo o que é matemático
e geométrico, assíduo,
inquestionável, previsível,
sem canto nem engano,
sem desvio, prazer nem esperança.

Os músculos lassos e flácidos
sabem de cor o equilíbrio
dos movimentos repetidos,
sendo sua a substância da letargia
no enlace justo dos tendões,
nos dedos como malhos,
nas palmas tectónicas das mãos,
capazes de adormecer paisagens
privatizadas, nunca visitadas.
Pernas como tesouras
recortam sulcos febris
de infindáveis plantios e lavouras;
de trilhos e carreiras fabris,
arquitectando perenes destinos
nas paredes do tempo.

O funcionário recurva-se na secretária
mirando um memorando
como quem contempla a morte
anunciada de um conhecido.
Chegara a requisição de mobiliário de escritório
e o que restava lá fora era a dor da tarde
esperando o hálito moroso das folhas por nascer,
supondo a dúvida de saber
se se é incompletamente infeliz.

Foto DAQUI

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sexta-feira, abril 18, 2008

Poemas da Terra Nova II

Mixed foods; mixed tastes;
the salt and the bell peppers,
drawn in a piece of paper.

The hoods and the waste;
the spreading innocence of beggars,
pawns redeemed by hunger, misplaced.

Pawns of the hills,
children of the night,
forgotten sons of orgasmic chills,
orphans of their men-given rights.

San Francisco, April 17th, 2008
Photo: Ron Niebrugge

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sexta-feira, junho 29, 2007

On the ledge

She´s there standing,
No one knows
If she stays or if she goes.

On the sidewalk,
On the ledge,
She´s alive and fully fledged.

A bird of death
Into the fall,
When she had Springtime
Above it all.

Wish she had a mountain to climb,
Some other place to find herself,
A place to spill the eyes
That went on tears from her heart.

But she chose to fly,
To renounce oneself
And release the tears,

To throw away the keys
And prevent the years
To crease the Calling,

And earthly age the Will,
Wishing only to fulfil
The Dream to make a dream
Emptied by the sand,
Breathed by the wind,
And even so withstanding.

Wish she turned up labeled
And arrogant, very assuming,
But then again giving up everything
One obtains all.

Wish she had a mountain to climb,
Some other place to find herself,
A place to spill the eyes
That went on tears from her heart.

Ofereço esta letra ao meu Irmão Ricardo Tomás, one of the five horseman

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