quinta-feira, dezembro 31, 2009

2010

Preparo o novo ano,
infectado pela epidemia das febres colectivas.
Não posso esquecer os que me esqueceram.
Quero ter 12 passas e um copo de champanhe.
Não posso estar triste nem só.
Quero afastar de mim a melancolia
e vou procurar cumprir uma lista de boas intenções.


Começo por esquecer os que se lembraram,
esqueço de me esquecer e bebo um copo a mais.
Dou 12 passas num cigarro de hasheesh
e vazo latas de cerveja até bambolear.
Chego a ser o mais solitário dos homens,
desencontrado e irreconhecível na multidão.
Dou por mim confrontado com a minha tragédia
e conformado com a dor de cabeça.
A lista de boas intenções, essa,
começava por deixar de fumar
ou cumprir sonhos de manhãs saudosas,
e tudo com início no ano que começa.

Entro com o pé direito
e repiso a mesma sola
com o mesmo pé,
no mesmo chão,
mas incapaz de olhar com nitidez o futuro,
descrente na felicidade provocada
dos mais incrédulos,
junto à Torre de Belém
ou no réveillon do Ritz.


Entro com o pé direito
e quero dormir,
abandonar todos os projectos,
esquecer os que se lembraram
e os que se esqueceram;
quero curar a bebedeira
e acordar depois,
para um excelente ano novo,
crente apenas no vómito provocado
dos infelizes.

Chega de poéticas.
É tempo de nos zangarmos.

31 de Dezembro de 2009

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sábado, dezembro 26, 2009

quinta-feira, dezembro 24, 2009

Estado de Amor e Confiança

Quando o desejo me libertou subiram em mim agonias
por um par de asas de quem apenas queria andar.
Não dou tanto quanto recebo e nem sei como planar,
que não há vento favorável não sabendo onde se quer chegar.

Quando o amor me libertou fiquei mais vazio que o ar,
mais soante e vago que turbas de pecadores em abadias.
Não dei o que esperavas nem supus o que querias
e só quando, só, quis ser amado, fui o mais altruísta dos egoístas.

Quando o mar, afinal, tocou a praia,
foste a primeira das musas desinspiradas a cair,
mas eu quero praças, quero grandes seixos de Ganges e fruir
desta graça trágica a que me dou quando ficando quero ir.

Ajuda-me de mim próprio ou esquece.

A quem quiser e aos Pearl Jam

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segunda-feira, dezembro 07, 2009

Voo de Cisne

Sem um poema, que te diria eu?
O que diria perante um mar sem praias
de mil beijos em mil línguas
no dialecto táctil dos nossos corpos?
Que poema serve uma Cleópatra
banhada na imersão do meu sonho quente?
Que alfinete encontrarás na lapela do meu peito
alfinetado de saudade para sempre?
Voamos os dois para destinos capitais
sobre uma pousada ibérica em que nos desencontramos.
Desta pequena janela imagino-te triste,
acima de campos de algodão
que o Sol tece em nós deuses,
incapazes de fazer das próprias lágrimas riso.
Que pajem sou eu, que nada te dei?
Que poema equipara a tua bondade,
a desarmar-me com ternura e decência?
"Estou tão cansado; não preguei olho."
O Sol entrou-me pela janela assim que levantei voo
e nunca saíste do meu pensamento.
O leopardo fez-se gatinho que aninhaste ao colo,
depois de arranhado teu sangue doce.
Foi novamente numa encruzilhada
que larguei ternamente a tua mão
- a encruzilhada do Rei, para uma rua de Liverpool londrina.
E eu voltava a cantar-te baixinho:
"Estou tão cansado; não preguei olho."
Sinto-me o português marroquino da Tajina,
que antes fosse para Madrid agora
ou contigo para a Índia.
Estou quase a aterrar.
Ampara a minha cabeça e canta-me:
"I'm so tired; I haven't slept a wink"...


Ar, 7 de Dezembro de 2009. Chegada: 11h35

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terça-feira, dezembro 01, 2009

Corações Crioulos

Soube que o tempo seguia
como um rio para o mar,
fundo mar dos teus olhos,
incessantes,
de infindável ternura desenhados.
Aprendi que vale a pena viver
tão rápido como a madrugada a chegar;
que depois do dia virá sempre o dia,
e a noite é uma carícia que não cessa.
Ficamos mudos em mundos castanhos
de olhos risonhos.
Cada vez que vimos e vamos
ficamos num sonho plantado
nos nossos corações crioulos.
Por amor somos os maiores tolos,
e uma noite são dias e noites
surpreendidas pela madrugada.
Agora somos a mesma estrada
que em tempos cindiu duas longas viagens.
Somos o abraço em que cabes aninhada,
tão bem no meu peito,
teu berçário de miragens.
Há dois mares que desaguam num rio.

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