quarta-feira, agosto 06, 2025
terça-feira, agosto 05, 2025
Alfa e Ómega
e foi imediatamente vacinado.
Antes do choro, já devia à Caixa.
Antes do leite, já devia ao Estado.
Antes do nome, já tinha número
para repúdio à herança do passado.
A mãe sorriu serena ao assinar papéis.
Lá fora, os tios faziam contas e desejos
de não serem os padrinhos —
de não lhes caber a honra dos benfazejos.
O avô estava com mau vinho.
Via na TV que o défice tinha subido.
No ecrã da entrada: inserir novo utente —
e o país registou mais um contribuinte.
Como pode um nascimento
ser burocrático e indiferente?
II. Primeira Factura
Aos noventa dias, a mãe foi trabalhar.
O pai andava pelas margens do relógio;
de costas para a proa, de frente para o mar;
pela casa como sombra no soalho.
Morava nas horas de vazio, ao contrário.
Ao miúdo faltou colo, mas houve horário.
Entrou cedo, sem saber despedir-se.
Só à tarde soube estar no infantário.
Chorava todo o dia como quem protesta
e foi entregue à ama com uma tabela.
Um recibo em troca de uma promessa
de afecto, atenção e beijos na testa.
As manhãs chegavam frias, cheiravam a sopa velha.
De olhos esbugalhados, aprendeu a esperar cedo.
Vindo do estômago, acusou na alma um lamento.
À pele tinha já tatuagens por dentro.
Ficou no peito um choro permanente em ponto pequeno.
III. Primeira Lição
Aprendeu a contar antes de brincar
e a levantar a mão, nunca a voz,
que saía engasgada para perguntar.
Sabia o seu lugar, mas não o porquê.
O recreio era curto para um silêncio de pé.
Pintava o sol amarelo no canto direito.
A relva era verde; o céu azul por defeito.
Um dia trocou as cores por pura invenção
e levou um reparo jocoso de reprovação.
Mãos nos bolsos como raízes no solo,
olhos clementes, na cabeça já um nevoeiro,
e no peito um precoce alvoroço,
um medo ansioso do próprio receio.
Distraído e sensível, era um problema,
peça numerada, desencaixada do sistema.
Sempre pessimista o prognóstico.
E num dossiê com nome e diagnóstico,
chamaram-lhe desatento e coisas que tais.
Depois chamaram os pais.
IV. Primeira Nota
Mediam-lhe os lapsos, nunca o sonho.
Pesavam-lhe a voz, o timbre, os gestos.
Não lhe auguravam futuro risonho.
O erro pontuava sempre mais do que o resto.
Imaturo, preguiçoso, sem método, disperso,
cortaram-lhe a dúvida no quadro a giz.
Finda a aula, a equação era o verso
do poema a metro que não escreveu nem quis.
A ferida em pus da comparação,
o silêncio vedado da sobrevivência,
os dedos nus expondo a hesitação
das mãos frias e húmidas da subserviência.
E a vergonha que se fazia identidade,
a evitar os olhos e os conselhos,
desejava apenas a faculdade
de desaparecer nos recreios.
V. Primeira Porta Fechada
Entrou na faculdade como quem entra no mar:
sem saber nadar, mas saturado da margem;
com esperança amarrada a frágil coragem
e uma sentença adiada, por classificar.
Na mochila levava clamores da infância;
nos cadernos o virtuosismo da inocência,
e o mundo parecia quase possível,
num passo novo, mais alto e livre, uma dança
incauta sobre o tabuado da passagem de nível.
O primeiro licenciado da família.
Em casa, o chão tremia.
O pai — que andara anos ao volante,
tendo o camião por cama —,
de alma remendada e corpo exangue,
trazia tostões de vergonha e má fama.
Paletes, verbas e volumes não conferiam.
Folhas por fechar, colunas que não batiam,
planilhas discrepantes, contas erradas,
e o erro vestiu o fato das madrugadas.
Veio o despedimento e depois o silêncio,
o olhar embaciado, o gesto ausente,
a década de trabalho num saco de expediente
e o resumo sumido num último recibo,
a sombra gelada do que não auferiu
em perdão, clemência ou apenas abrigo.
A mãe gritou durante semanas
até que, perante a letargia, deixou de falar —
um dia fez as malas à pressa, sem dramas,
deixou a casa pela de outro; levou o lar.
O filho ficou com o pai, num pacto mudo
entre a culpa e o pudor do abandono.
Era já homem, dizia-se, e isso era tudo,
mas sentia-se cão com trela sem dono.
Faltou o passe. Faltou o mês.
Faltaram livros, sorrisos, jantares.
Venderam-se enciclopédias, vinis e CDs.
Acumularam-se dívidas e pratos por lavar,
currículos enviados inutilmente.
De olhos vagos noutro lugar,
no fundo RGB de um ecrã, ausente,
o pai passava noites brancas a fumar.
O miúdo voltou às aulas, fingiu rotina,
mas os livros pesavam como tijolos na obra.
A vergonha colada à cadeira, vidrada na retina,
e à janela o futuro extinguia-se a cada hora.
A chamada em falta não foi indisciplina,
apenas um dia fora, uma cadeira vazia,
e no anfiteatro ninguém perguntou.
Deixou o curso no segundo outono
para sustentar a casa em colapso.
Não houve anúncio, só abandono
e um nome ausente nas pautas,
frequência da licenciatura por meio ano,
como se nunca ali tivesse estudado,
como se naquelas salas nunca tivesse tido aulas.
Inútil para efeitos profissionais.
VI. Primeiro Recibo Verde
Começou por dias sem nome nem recibo,
horas ao sol de Junho, a ganhar tostões
fora da folha, por baixo da mesa, do vidro.
Dois meses num balcão, três num arquivo,
quatro num escritório a tresandar desinfetante.
Chamavam-lhe rapaz, moço, assistente.
Nunca usavam o nome constante
na ficha que fora para o lixo.
Não lhe conheciam apelido.
Levava pão e papel higiénico na mochila.
Guardava restos de si no bolso, rabiscos,
resumos e esquemas de vidas sonhadas
noutra dimensão de astros e meteoritos –
ideias, poemas curtos num caderno de escritos,
versos, apontamentos e autoavisos,
pedaços de sim e talvez de um longo Inverno
que rompiam terços e fardas de improviso.
Tinha uma camisa para cada semana
e as solas gastas de desventura.
Picava o ponto como quem se ausenta,
sorrindo por compaixão e ternura.
Trabalhou até as palavras sangrarem
e os músculos, silenciados, pararem
com as fotocópias e o toner,
com a síncope de rolamentos,
com as horas extraordinárias
de um esforço nado-morto.
Jazia, ao final do longo dia,
a embalagem de um corpo
reposto, inerte, na prateleira.
Nem o espelho devolvia o rosto
e não haveria outra maneira –
mãos cheias de horas até ao osso,
majoradas como o sono ao tutano –
a vida a boiar no fundo de um poço.
No bolso, o poema insistia:
riscado, rasurado, uma pedra de sal.
No bornal, cadernos gastos onde escrevia histórias
de vidas que já não sabia se eram suas —
às vezes, de tão escritas, pareciam-lhe já memórias.
VII. Primeira Morada
Trabalhava para dois.
Não bastava para o mês —
como um cântaro rachado,
carroça manca de bois,
suor do corpo quebrado,
vazado com o brio da surdez,
silêncio fervido, arroz para três.
Pratos lavados com água da véspera,
moedas escondidas num frasco de vidro,
migalhas de um mapa, ossos de medo –
guardada uma porta por dentro.
O pai, apagado em brasa fria,
e a casa encolhida, sem fôlego,
a respirar sem saber que doía
o ar denso, a roupa a cheirar a mofo,
o tempo parado no fio da travessa,
o vazio sentado à cabeceira da mesa.
Era amor doente, na borda do precipício,
silente, cabeça encostada à parede
e os olhos a meio sem suplício.
Vendeu-se um candeeiro de griffe,
um móvel de sala quase dado,
um conjunto de cama bordado,
e ao jantar houve bife.
Depois da máquina de café,
foi a televisão,
e o mundo deixou de entrar.
Já nada crescia naquele chão gasto.
O afeto pendia de um prego torto.
O amor dormia sem luz de presença.
Mordendo o apelido, enrolou o casaco,
alçou as memórias felizes ao ombro
e deixou a chave, como uma sentença.
Pagou o mês de caução e o mês de renda,
e mais um, adiantado. O poema, inacabado.
Na periferia, um cubículo com eco,
uma janela opaca para o poente
de antenas tortas sem conserto.
Sem estrado, o corpo dormente.
Sobre o colchão, os braços inertes,
as mãos e os olhos secos fechados,
a marcar território de recomeço.
Era sua a chave do desengano.
Seu, o desígnio de rodar a tranca
do cárcere e da liberdade.
Eis a chave, a porta, o ardil.
Eis da vida o maior preço:
a miragem do oásis transariano –
da família nuclear a três
à desdita tragicómica do covil,
saldada mês a mês.
VIII. Primeira Traição
Uma janela sem mundo, uma luz que pendia,
três pratos de vidro, uma colher de plástico
e o silêncio opressivo — espesso, doméstico.
Havia espaço para o tempo, surdo-mudo,
e nenhum lugar onde pousá-lo.
O vagar sem préstimo futuro
corroía-o, tornava-se espelho.
No vazio, teimava o poema,
crescia devagar entre nervuras,
cicatrizes de sal, linhas de fractura,
erva daninha a brotar dos azulejos –
poema escrito sozinho, linha a linha,
tomando-lhe a mão sobre textos
que o desenhavam em liturgia íntima
de salvação penitente, solitária, impossível.
A caneta era cruz, o papel sacrário,
tacteando a luz com dedos de sombra,
soprando cinzas em busca de brasa,
traçando na terra o território.
Às vezes, no lume breve de um verso,
acendiam-se os rostos do pai, da mãe,
e o cabelo de um amor desconhecido.
A mãe sussurrava na presença de um homem.
O pai esquecera-se do próprio nome.
Ninguém viera ainda por ele.
Quando o frio se fez hábito
e já não esperava visita,
viraram-lhe o mundo ao contrário,
chegou um incêndio vestido de brisa.
Ao silêncio que por fim se fez casa,
respondeu uma voz embriagante, sem aviso.
Pensava-se enfim intacto,
e eis que a voz reabriu a ferida.
Outras houvera em noites de bebedeira,
beijos molhados e corpos sem nome,
fogos-fátuos de um desejo sem fome,
mas esta era chama que fingia lareira,
promessa suave com corpo, mãos, língua, enleio.
Conheceu-a online, num dia qualquer,
e tropeçou no que parecia passeio.
Entrou sem bater uma presença de neblina,
ondulante, generosamente feminina.
Era olhar e feitiço, beijo e doutrina,
e ele, ajoelhado, cansado e carente,
rendeu-se ao calor de um regaço.
Beijava-a com o frémito do tempo perdido,
como se o corpo soubesse sempre o caminho,
como quem afaga a ferida e encontra abrigo.
Respiravam-se inteiros, no mesmo compasso,
odor febril a lume húmido, cioso perfume,
disparo certeiro, júbilo e queixume, erro crasso.
Um deus cego pedia-lhes lume
numa vertigem de sombra inteira,
estreitando o cubículo num abraço.
Nela viu um país por fundar.
Mas o país não tinha mapa,
era bruma em manhã sem estrada,
e o riso, outrora fonte, secava as margens
devolutas de sede a cada gesto.
Já não lia poemas até ao fim,
sorria a meio, mudava de tema.
Tudo nela se tornou frio indigesto
onde dantes havia frenesim,
e ele, sem saber, já saíra de cena.
A cama, quente, fazia-se ilha
de um náufrago em corpo ancorado.
Ela ainda lá estava, depois da neblina,
mas algo no gesto ia já longe,
num horizonte que não pedia resposta,
um olhar que não devolvia reflexo.
O coração tornou-se um anexo
onde começou a chover por dentro,
num adeus sinalizado pela ausência de sexo,
espelhado em promessas de vento,
na alteridade do toque que fora abrigo,
agora estéril recusa, castigo.
Quando enfim entendeu o enredo,
era tarde: traíra-se por migalhas de afeto,
fizera-se menos que concubino.
Curvado no altar do talvez,
pedia apenas uma palavra inteira –
bom dia, boa tarde, um sinal cortês,
feito cão à porta, sujeito às probabilidades.
Ela menos falava, e quando o fazia
era como quem dissesse outra coisa.
O amor transacional revelou-se à luz do dia.
Não fora amado, mas usado.
O poema, rasgado, escrevia-se à faca.
IX. Primeira Herança
Veio pequeno, de olhos baços, sem verbo,
um choro sem gramática, um tremor de berço.
Ele viu-o como quem se olha do avesso,
num clarão translúcido de perguntas sem resposta.
A infância reencontrava o silêncio.
No fundo da memória, uma voz de cetim, uma rota.
Uma ternura longeva latejava no pulso,
um instinto sem nome, um abraço perdido.
Recordou o lar que lhe faltara,
o colo adiado, o abrigo prometido.
Sentiu no peito um sopro de alvorada,
promessa de sol depois do nevoeiro,
aroma de Lua nova e terra molhada.
Na pele doce do filho, escrevia o futuro inteiro,
fundava o tal país num só verso,
jardim por regar, fundeado nas entranhas do universo.
Na consciência o profundo receio
de falhar como lhe falharam primeiro.
Enquanto isso, erguiam-se trincheiras no quarto,
beijos conjurados num cerco pós-parto, ventre fechado.
A criança tornou-se penhor de amor taciturno,
cobiçoso, avarento, a medir cada afago como hora de turno.
No berço ele via uma jangada, um contrato assinado no escuro,
um bilhete de resgate ou condenação.
O leite azedava sem lume, a noite rangia nos dentes
e no peito farto, gelado num idioma de fome.
O desejo contrariado, rejeitado, deficitário.
Ali estava, sem nome, a contabilidade da ternura.
Ele dera por si visitante na própria casa,
pagante de uma dívida sem fatura,
credor improvável de desejo lúbrico,
estilhaçado no reflexo de um espelho translúcido.
No poema inacabado, um voto secreto a cada sílaba:
quebrar a sombra antes que a luz se apague.
Mais que nome, sangue, carne, rosto,
herança era sopro de abandono ou esperança,
cisma sem dono, sismo no osso,
e um pacto inexprimível na página branca.
Ali, às grades do berço, germinava a condenação.
X. Primeira Sentença
Rubricou a ausência com a mão tremida
sobrevoando a última cópia em papel timbrado.
Um carimbo sobre a paternidade; sobre a vida.
Sem apelo, estava anulado o contrato.
Pagou a primeira pensão de alimentos
na penumbra dos dias sem volta.
No sigilo da casa, o colapso, a revolta,
o grito mudo dos brinquedos arrumados,
a alucinação de uma criança a correr descalça,
sem chão, sem pátio, sem extrato bancário –
apenas as semanas hipotecadas no calendário.
No poema faltava uma hora para a meia-noite,
por entre recibos e segundas vias sem rumo,
restos de dias vagos guardados no fundo do armário,
pedaços de vácuo e saliva, um expediente de fumo,
envelopes rasgados sem outro destinatário.
Quebrado, sem rosto, sem cais, apenas um nome
com saldo negativo às portas dos tribunais.
A família reduzira-se a dígitos, selos, clausulados
em penumbras facturadas ao mês com código IBAN.
A própria família. Menos que sozinho,
fora-lhe extirpado o coração, amputado o caminho,
sem eco de humanidade devolvido num silvo,
sem memória de arquivo, mendigo administrativo
nas esquinas refundidas da retórica jurídica,
paiol de fantasmas insensíveis das pragmáticas,
a empurrar almas em custódia nas órbitas da compaixão.
Selado num código postal, reduzido a rubrica digital,
observava sem altar um deus de plástico,
como tantos de joelhos, prostrados nos sacrários
das repartições públicas, em súplicas e sermões burocráticos.
No genuflexório fiscal silenciam-se os rumores da insurreição.
Quem decide quem fica, quem parte, quem sobra?
Quem é o traidor, o traído, o réu, o arauto?
Entre códigos e autos, era possível sonhar nova obra,
era ainda a árvore passível de rebentar do asfalto?
Na quietude do verso, germinava a fagulha, a centelha,
um clarão que incendiasse o mundo, o poema.
XI. Primeiro Crepúsculo
Os meses caíam como folhas mortas na tijoleira.
O tiquetaque latejava no pulso um aviso de falência.
O baque à partida do pai ao domingo; da mãe à terça-feira.
O corpo um pergaminho gasto, uma lembrança de linho,
o adeus ao destino, o regresso infame à inocência.
O tempo, na sombra da perda, nunca devolve o início.
O filho calçava os seus velhos sapatos de inglória;
herdada a mesma febre de fantasmas sem nome,
inelutavelmente à sombra do que viria a perder.
Passava menos vezes, sem mágoa, culpa, história.
Na voz arrastada, monossílabos de fome.
O miúdo era já pai sem enredo, reencenando a memória.
O agora avô e órfão via-se passar ao espelho sem reflexo.
Tornara-se vulto nas salas de espera, imprestável
como o relógio de parede parado nas duas horas;
presença decorativa nas reuniões de família.
Espectador de um filme dobrado, lábios desconexos,
comia pré-cozinhado o limiar da lucidez, insanável,
e ninguém batia à porta, o telefone não tocava.
Comprimidos e TV generalista, peça carcomida de mobília.
Já ninguém o reconhecia no quiosque, no café, na farmácia,
ou seria antes o contrário, o ângulo obtuso no átrio da falácia?
Senhas, consultas, corredores, máquinas, vozes automatizadas
numa dança esterilizada de corpos numerados promovidos a utentes,
e um multiverso de outras dores, mais a obsolescência programada.
Árduo é o caminho dos mártires sem promessa de virgens para os crentes.
A alma, diziam, sobrevivia, mas onde? Em que servidor,
se tudo cabia num processo arquivado, razoado no computador?
Quem herdará os restos de uma rotina sem testamento?
A identidade tornara-se documento sem validade, sem leitor,
encerrada numa pasta sem estante ou corredor, um ofício digital
codificado e marcado a negrito de nulidade existencial.
Nada ficou de uma vida garimpada em recibos e diagnósticos
triturados por juristas, call centers, prestamistas e médicos.
A liberdade da escolha múltipla, entre vícios não subsidiados –
e outros, subsidiados, à boca da urna. Votara e pagara sempre,
sem alguma vez lhe ter sido devolvida a pátria, os anos.
Passavam-lhe à frente sem cortesia nos transportes públicos
e na fila de atendimento da Segurança Social, uma carestia visceral,
um alheamento comprometido em anestesia testemunhal.
No bolso do último casaco, gasto e amarelado, um caderno manuscrito.
XII. Primeiro e Último
O filho dobrou o casaco. Não disse nada.
Não sabia o que fazer com o caderno.
Não o abriu nem se desfez dele: guardou-o
no fundo de uma caixa de cartão,
sob uma pilha de documentos e recibos,
sem respirar ao canto de um sótão.
Muitas décadas passaram pelas dobras do calendário
até que o neto o achou, inscrevendo-o numa lista
– um inventário de objetos – sem razão aparente.
Não leu, mas cuidou-o numa caixa-relicário
de um tempo analógico como documento.
Havia peso no silêncio gritante da memória,
uma aura dourada de papel velho, eloquente,
com manchas de café, rasuras, vestígios de saliva, histórias.
Geração após geração, o caderno ficava.
O nome fora apagado das bases de dados,
mas a solenidade mística da matéria teimava.
Três gerações depois, foi o bisneto que, enfim, o leu
pela primeira vez, num gesto profano de curiosidade sagrada.
O texto pulsava, as palavras ardiam intactas, um fogo cresceu
em labaredas inextinguíveis de uma única e íntima chama.
Nunca conhecera o bisavô, mas ouvira dizer que escrevia.
Não quisera ser imperador ou sua senhoria,
mas lembrar que este é um lugar próspero
de abundância e beleza para todos;
que a ganância envenenou os poços
e barricou-se em trincheiras de certeza e ódio.
Homens e mulheres, mulheres contra homens,
e passado tanto tempo dos mesmos no pódio,
repetiam-se os medos, os gritos e as palavras de ordem.
Mas pensamos demais e sentimos de menos.
Se as mãos se dessem, os muros caíam
sem donos, sem deuses, sem a esperteza
que fractura a humanidade e macula a inteligência.
A natureza é violenta sem bondade, sem gentileza,
às mãos de brutos que regimentam a decência.
Não somos máquinas nem gado, mas homens
que lutam contra a escravatura,
quando a luta é pela liberdade!
E mais de um século depois ainda a palavra
a transpirar de um lugar livre sob a pele,
de beleza plantada sobre as cinzas do desespero.
Ainda a tal “democracia” a revolutear numa parada
de armamento imperialista sem quartel,
acesa apenas quando o povo espantar o medo.
Ainda o repto pela demolição das fronteiras,
da intolerância e do ódio; por um mundo de razão
onde o progresso seja fruto de alegria, não um açoite.
Ainda a promessa gorada dos brutos, uma longa noite
de mentiras e gumes afiados pelo jugo da liberdade.
Na contracapa, entre emendas, contas e datas,
encontrava-se um sussurro sublinhado,
um cometa de grafite que aguardava
olhos cadentes no rodapé gasto.
“Não somos o que nos fazem, mas o que fazemos de nós”,
leu em verso quase ilegível, urgente e torto.
O bisavô não estava vivo. Não estava morto.
Dissolveu-se na base de dados, mas o poema resistira,
e com ele uma luta simples pelo que é decente,
por libertar a vida, fazê-la dançar ao vento.
O bisneto, já homem no mundo,
citou-o em discurso diante da assembleia.
A câmara permaneceu em silêncio mudo.
Anos, séculos, milénios e nunca depois, sobreviveu a ideia
e o caderno reapareceu depois de tudo –
da ruína, do arquivo, da arca, do museu, da feira,
do infinito do espaço-tempo profundo.
A ideia fecundada derrubou todos os muros.
A palavra fez-se semente sussurrada,
reinventada, retransmitida, ousada.
Como senha, prece, rumor.
Como se fosse a primeira vez.
Como luz em água,
eco em pedra dura,
chama ao vento,
incendiando o silêncio
ao nascer da aurora.
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sexta-feira, abril 25, 2025
Manual de Desobediência para um País por Fazer
não foi bem isto que Abril prometeu.
Havia cravos; hoje há ecrãs,
selfies sem Marcelo, silêncio nos cafés.
A revolução saiu diagonal do telejornal,
feita de molduras e retrovisores.
Enquanto isso, os merceeiros
aprenderam a ser CEOs.
e Kafka espera em linha no call center
sem previsão de atendimento.
O processo é automático
e a culpa é tua, cidadão 405-B.
A felicidade tem código de barras.
Automatizaram a empatia
e empatizaram os automatismos.
Seja como for, mentiram-te sempre.
Chamaram-te livre,
mas só te deram turnos.
Não há censura, há viralidade,
um eco tão ruidoso
que oblitera a voz do pensamento.
O futuro foi vendido à prestação,
com juros de desilusão a longo prazo.
A terceira vaga rebentou
num tsunami de notificações,
uma greve geral de sentido
em que nos adiamos.
Nós cantámos,
coreografámo-nos à beira do abismo.
Nós escrevemos,
demos murros no ar e beijos na lama.
Nós andámos à pancada com a esperança.
Quase perdemos. Perdemos?
E ainda assim — ainda assim —
trazemos Abril nos bolsos, amarrotado,
como quem esconde um poema perigoso
num país habituado a não ler.
Mas um dia acordam —
e nesse dia, meu Irmão,
não será com tanques de guerra, mas com versos,
com mãos sujas de tinta, de giz e de terra,
com vozes afinadas como dentes afiados
que faremos a Revolução
por fim —
inteira,
com todas as letras.
e comer duas refeições mediterrânicas por dia.
Paremos tudo, sine die —
as fábricas, os códigos, os turnos, os ecrãs.
Fechemos os bancos,
os supermercados,
a boca dos donos do mundo.
Não queremos esmola,
queremos o justo:
tudo repartido.
A igualdade não se negoceia.
E se for preciso arder tudo,
que arda.
Mas que nasça, por fim,
um país vertical impossível
de paisagens horizontais,
nosso.
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quinta-feira, abril 17, 2025
🚫 CENSURA DIGITAL — ARQUIVO DO BLOGUE CADERNO DE CORDA
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segunda-feira, abril 07, 2025
AVISO: Data d'O Jantar (Anno XX) remarcada para 24 de Maio de 2025
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quinta-feira, março 27, 2025
20 anos de Caderno de Corda e a convocatória d'O Jantar!
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quinta-feira, fevereiro 13, 2025
Anno XIX – O Jantar
- Anno I - O Jantar
- Anno II - O Jantar
- Anno III - O Jantar
- Anno IV - O Jantar
- Anno V - O Jantar
- Anno VI
- Anno VII
- Anno VIII - O Jantar (ou O Regresso)
- Anno IX - O Jantar
- Anno X - O Jantar
- Anno XI - O Jantar
- Anno XII - O Jantar
- Anno XIII - O Jantar
- Anno XIV - O Jantar
- Anno XV
- Anno XVI
- Anno XVII - O Jantar
- Anno XVIII - O Jantar
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segunda-feira, novembro 11, 2024
Jane (7 de Dezembro de 2008 - 11 de Novembro de 2024)
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sexta-feira, outubro 04, 2024
Nova canção: "Não Esqueças de Lembrar" [4’16”]
Um amor grande
como um mar sem praias
Quando te vi
fui de alegria às lágrimas
E nos teus olhos
não deixes de lembrar
… os meus
E enquanto puderes lembrar
não esqueças de cantar
Nos teus olhos brilha o mar
e um pôr-do-sol aberto de par em par
E nos teus sonhos
não deixes de sonhar
… os céus
Amanhã de manhã
vai brilhar uma estrela,
é aquela que revela
não haver adeus
Dessa janela
não esqueças de lembrar
… os teus
Hás-de poder cantar
esta canção de embalar
a quem a souber ouvir
e mais tarde escutar,
a quem seja para nós
uma bênção de Deus
Não te esqueças de a cantar aos teus
Amor meu,
coração fora do peito,
contigo sou inteiro,
somos um desse jeito
Somos um só grito,
infinito,
amor perfeito,
não esqueças de lembrar
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domingo, setembro 08, 2024
Infinito
uma fracção de segundo
condensando toda a matéria,
passado, presente e futuro,
fusão comprimida de cristais
onde já nos encontrávamos,
e mil gatos, areias e mares antigos.
Houve explosões, expansões, reacções
e a remota improbabilidade
de que o primeiro rio, o primeiro sismo,
tenham feito rolar a primeira pedra,
cumprindo o curso exacto
de formas prometidas
e eventos necessários
para que aqui estejamos nós,
em Milfontes, tecendo presente,
moldando futuro, segurando infinito.
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sábado, junho 01, 2024
Crónica e fotos d'O Jantar do XIX aniversário brevemente
Estimados leitores e confrades cordianos, a publicação da crónica e das fotos d'O Jantar do XIX aniversário do Caderno de Corda está significativamente atrasada por motivos que se prendem com a priorização de projectos artísticos, nomeadamente literários, que me ocupam os tempos livres. Ao momento ainda não foi desenvolvida a crónica nem as fotos foram editadas, mas prometo fazê-lo o mais brevemente possível. Este ano faremos um registo menos ambicioso, mais simples, dadas as circunstâncias e o tempo disponível, mas em 2025, ao vigésimo aniversário do Caderno de Corda, promete-se uma celebração nunca antes vista. 'Té já!
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quarta-feira, maio 22, 2024
Deus Está na Chuva
no fumo ondulante do cigarro,
formando sombras espectrais,
rostos de sereias e corpos de amantes,
antílopes que brincam na casa do lago,
sem medo e sem pressa,
onde a morte por desventura
seja apenas mito, promessa.
Severin espera-te lá,
onde não há coincidências,
onde cada bala apanhada com os dentes
seja a ilusão que desmente
a morte imaginada.
São gomos de areia molhada
os pés que pisaste, bem-me-quer desfolhado,
no olhar assustado que me lançaste.
Dizem que bebeste a solidão,
que escorreste a garrafa que repousa
em estilhaços, como tu, no chão.
Bendito esquimó que não conhecia
a Deus, pecado ou religião.
Invento mentiras para contar a Verdade.
Deus está na casa do lago,
nas sombras que se desvanecem,
nos sonhos que nunca adormecem
e na vida que, sem desventura,
após a morte eternamente floresce.
N. do A. – Poema composto a partir da reescrita do poema “Ficção”, redigido em Maio de 2009 e publicado em 2012 no livro “Sétima-Feira”, e da letra de uma velha canção, titulada “Areias de Júpiter”, que nunca chegou a ser gravada. “Ficção” fora dedicado a Kurt Cobain, em parte inspirado por Velvet Underground.
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Mais que Eternidade
melodia transformada em saudade e cântico.
É preciso cantar-te às pedras que não clamem por nós,
é preciso largar um dilúvio que se estanque na pauta,
esquecida sob o tampo da partitura do silêncio,
ao resgate do milagre, da simplicidade mundana,
da descoberta sagrada e da existência profana.
A vida é sempre a perder, mas a música é eterna.
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quarta-feira, março 27, 2024
19 anos de Caderno de Corda
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sábado, março 23, 2024
Anno XIX - O Jantar (convocatória)
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segunda-feira, março 11, 2024
Feliz Agora (Porra!)
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e o verso flui na ponta da escrita automática,
corrente como água sem ter para onde.
Na dança acelerada de dias alados,
de clepsidras arenosas como rios secos
e de consumos vorazes em vitrinas expostos,
a vida, subtil, verte-se entre dedos, sabemos
- palco de ilusões, espetáculo frenético
de música apressada e caos poético.
Desumanizado, excedente, o consumidor
perde a essência do gosto, perde o sabor,
despreza lamentos em caligrafia lenta
e versos que abraçam partidas impossíveis.
Num portal para nenhures um poeta sem choro
rascunha a efemeridade de ilusões adiadas.
Num beco urbano um palhaço plange e soluça.
Conhece uma jovem. Ela dá-lhe um arco-íris.
trariam fama, fortuna e glória se bem executadas,
mas a perícia sensível do virtuoso está muito desvalorizada
perante a tirania do limiar da pobreza
e do trabalho pela sobrevivência,
e não poderíamos ter todos fama, fortuna e glória.
São precisos inúmeros pobres para fazer um rico
e demasiados amenistas para carregar um líder.
Estupendas são as corrupções políticas,
os escândalos financeiros e o chico-espertismo,
mas não chegam para vomitarmos à mesa diante da televisão.
Afinal, eles são da nossa cepa, são os que se chegam à frente,
oportunistas vaidosos, munidos de bandeirolas, panfletos e bonés.
Passez à-la-caisse! Passez à-la-caisse!
A Pessoa, o poeta, cheirava a tinta fresca de tipografia…
Hossanas a quem conhecer o cheiro de cartazes
recentemente impressos, colados a pincel,
e a quem, dentro de pouco tempo,
souber como se folheia um jornal;
como se conduz um camião TIR;
como se atende um cliente a sorrir.
Os armamentos gloriosamente mortíferos
ainda não acabaram connosco de vez.
Ouvi dizer que somos do interesse de extraterrestres.
Mas tudo é vida fascinante, até nas montras brilhantes
com dons curativos de afeções de alma
e de espíritos voluptuosamente errantes,
ainda sabendo que os astros são os mesmos
que inspiraram os mestres de Da Vinci
e que o Sol é o próprio que tisnou Cleópatra.
Ah, e as vidas complexas da gente que aos andaimes sobe
sem outro fito que não a gente que à braguilha desce.
A indigência moral não assenta aos perdedores,
àqueles que, destroçados, desistiram de competir,
incapazes de depredar, derrotar, conquistar ou subjugar;
incapazes sequer de lutar pelo pão na mesa,
de limpar o suor nas mangas estiradas sobre os pulsos,
no entanto sujas de ranho e resíduos alimentares.
A luz do Sol abafa o silêncio das imitações de vida
de pobres, ricos e remediados, das bocas suturadas,
e havemos todos de morrer sem dar por nada.
Cá preciso de Liberdade para depois de velho ou morto.
A vida é mais custosa do que a vida que temos para dar;
é um recurso tão escasso quanto urgente, antes que morra,
e eu só tenho uma certeza: quero ser feliz agora, porra.
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terça-feira, março 05, 2024
Primado Aristotélico
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sábado, março 02, 2024
Liberdade É Escrever Poemas
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