segunda-feira, maio 30, 2005

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Afogo

Seguro está quem nunca ouviu;
Seguro está quem nunca soube;
Seguro está quem nunca viu
Palavra que na língua soube
A fel e amargura no teu peito;
A palavra sobre a qual deito
A cabeça cansada da ternura
Falsa que não enjeito.
Segura na mão a pedra
Impenetrável que não sonho.
Desejo o momento de repouso
No teu ventre vazio que não ouso
Pensar na voz que ouço,
Dormir e morrer neste sono,
Pois que a noite era uma menina
E vivia só a uma esquina;
Metia drogas e vaselina
E desaparecia com a manhã
Tal qual sol e noite
E lua e dia,
E depois, como sempre,
Simplesmente desaparecia
Desencontrada e esguia,
Oferecida e fugidia,
Conselheira e matricida,
Pois seguro é quem não duvida
De algo que não se suspeita;
Quem não tenha sonhado
Ultimamente a vida
E lhe suceda criatura seca e fria,
como a pedra que não sonho
na tua mão;
Como quem a vida morra dia-a-dia
Num sono mais profundo que a aparência,
E a mim, parece tudo quinta-essência
De um momento breve e aturdido
Após quinta destilação...
E de tão terrível disposição
Não distingo agora a Terra de um estéril promontório...
Maldita a insustentável reinação
Daquilo que é o falso sentimento de mim mesmo e o contrário.
Faz assim a consciência cobardes de todos nós,
E todos nós unidos por sermos cobardes solitários,
Avaliando o bem e o mal,
Atentamente observando a ponderação nervosa e imprecisa
Do fiel da balança antiga,
Daquelas que ainda se vêem numa ou noutra mercearia.
E depositamos toda a nossa certeza e ciência numa lingueta
Indecisa ou pervertidamente manipulada.
Que tempos estes, de profetas armados...
Em parvos!
Que tempos! de avassaladora confusão.
Pois que acabemos guiados por astros
Se não se der maior revolução;
Revolução de cabeça e coração,
Pois todos sabemos distinguir o homem bom do homem mau,
Independentemente do uso prático da razão;
De ritos de passagem sustendados na crendice vegetativa da multidão,
Em tempos da palavra esquecida,
Por mais que reproduzida, por mais que repetida.
Por quem juram aqueles homens?
Em nome de Quem matam eles?

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Parabéns Setúbal!

Além do supracitado no título, não mais me pronunciarei sobre o jogo ou o fim-de-semana. Mas maior foi a desilusão causada por uma determinada pessoa que não sabe fruir a vida, do que a derrota desportiva do Benfica. Não escrevo mais agora que não me apetece!

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domingo, maio 29, 2005

Esta já toda a gente sabe... agora vamos à dobradinha. Mas a imagem é de uma beleza invulgar, não é?

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«É vencer, é vencer! É ganhar, é vencer!»

Amanhã (já hoje, aliás) joga-se a final da taça. Ainda não sei onde vou estar a ver o jogo a essa hora. É possível que fora de Lisboa. Caso contrário, juntar-me-ia à malta do costume, em Miraflores. A primeira dobradinha conseguida pelo glorioso resultou de uma final precisamente com o Vitória de Setúbal, penso que na época 1942/43. Acaso vença o Setúbal, damos-lhes os parabéns. Domingo, 17 horas. Programa de festas no Jamor: Sardinhadas e piqueniques para começar; já dentro de portas, às 14 horas, animação musical, onde se incluem as actuações dos magníficos agrupamentos musicais e artistas ‘Canta Bahia’, ‘Four Dancing’, ‘Anjos’, ‘Toy’, a Banda da Força Aérea, algumas Tunas Académicas (blaaarrrghhh) e, por fim, a aterragem de paraquedistas que consigo trazem a bola de jogo. Trapattoni comentou, de véspera: «Devemos esquecer-nos rapidamente da conquista da Superliga. Preparámos o jogo em Óbidos porque seria um erro pensar que este é um jogo fácil. Somos campeões, mas temos de pensar em ganhar também este jogo. Além disso, temos a responsabilidade de defender a Taça que ganhámos na época passada. Os jogadores têm de mostrar atitude até porque se são bons jogadores não se podem acomodar.» Eu acho que a "velha raposa" percebe realmente de futebol. Aquela história de jogar só com um ponta-de-lança é que ainda me perturba um bocadinho. E... não sei, mas o Camacho é espanhol. Não tem o mesmo encanto. Trap, manda mas é vir a esposa e a família. Toda a gente gosta de cá viver quando se é podre de rico. Como disse o Paulo Futre, já jogador do Benfica, quando, nessa condição, pisou pela primeira vez o relvado da Luz: «É vencer, é vencer! É ganhar, é vencer!» Nunca mais me esqueci desta.

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sexta-feira, maio 27, 2005

"E por dentro do amor, até somente ser possível amar tudo, e ser possível tudo ser reencontrado por dentro do amor." (Herberto Helder)

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Carlos Paredes subversivo

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Paredes

Movimento perpétuo;
O tempo amordaçado
No som mudo de um século
Em pantomima coreografado

E televisionado a preto e branco,
Depois a cores,
Que ao cinema também deu alento
O Paredes e as suas dores,

Que pelas mãos duras e decididas
De génio predestinado
Coloriu e fecundou a imaginação
De mil imagens, com a guitarra a seu lado.

Só Paredes quebrou paredes,
E todo o som brotou
E saciou todas as sedes;
Os cansaços atenuou.

Que um homem fez aos outros sentir
O que era ser quem eram;
Que de si mesmos não queriam fugir
Como outros que em si desesperam.

Pois o vagar não é paciente
E o ensejo não espera
O momento certo da gente
Fazer que o tempo perca.

Porque urge ser sublime
No bater do coração,
Na guitarra que sobe acima
Do Paredes, a respiração,

Que bem se ouve na reticência
Das notas da guitarra em suspensão
Como se ele inspirasse o fôlego
Dos dedos às cordas, vibração.

Só Paredes quebrou Paredes
Em todos os silêncios que derrubou,
Em todas as palavras secas
A saliva que guardou.

Só paredes quebrou paredes,
Som liquefeito no nosso imaginário,
Abraçando-o delicadamente,
Como brisa sibilante, fez o verso e o contrário.

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quinta-feira, maio 26, 2005

Palácio de Scone. O trono e a velha Pedra do Destino.

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Jogo das Cadeiras

Se a lei não é justa aos homens,
Fome aos olhos de quem não vê nem sente
Numa música que pára abruptamente
O ludo de cadeiras dentro de um palacete.

Sentam-se reis num jogo de leis
E somos mais deprimidos quanto mais nos querem deixar contentes,
Procurando não pisar um amigo...
E uma cadeira para tanta gente...

E vê-se bem na tv
Nosso espaço sideral
Quem não sabe é como quem não vê
E quem sabe, não perde tempo

Por sinal

Se emite o mundo aos homens
A verdade em pacote e a equidade em gumes afiados
Não sei se não se sentam reis
À sombra de leis que não são senão reais para os seus criados

E vê-se bem na tv
Quem não sabe é como quem não vê,
Nosso implosivo espaço sideral
E quem sabe, não perde tempo

Por sinal

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quarta-feira, maio 25, 2005

Fado ainda. Desta feita, menos triste.

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Adaptação algo mimética do "Malmequer Pequenino"

Por te amar perdi a deus,
Por teu amor me perdi,
Agora todos os ais são meus,
Resta o plágio do que senti

Na agonia de não poder dizer
Da forma que mais se afeiçoa
Algo que sinto poder ser
Mais uma canção de Lisboa

Que não há coisa mais bonita
Do que ser simples sem saber
E não há regra nem limite
Para o que se sente, dizer

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segunda-feira, maio 23, 2005

São fotos de telemóvel mas são minhas!

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Um fim-de-semana em cheio - Benfica Campeão

No sábado, com velhos e bons amigos, barriguinhas cheias, bebidas, cantigas, danças e andanças, em suma, a felicidade dos outros, que é também a nossa. Aquele abraço para Pinto e Suzy. Nós somos para sempre.
-*-
Domingo, praia e hedonismo. Ao fim da tarde, princípio da noite, o Benfica sagrou-se campeão depois de 11 anos de interregno. Novamente com os amigos; caracóis, tremoços, abraços e a felicidade partilhada, comungada. Noite alta, Bairro Alto. Noite mais alta ainda, Estádio da Luz. Recebemos a equipa na Catedral. A festa e a organização do evento de recepção aos jogadores estava a correr às mil maravilhas. Muita música, bandas e artistas em playback, mas o sistema de som era excelente. Ainda lá vi, entre muitos outros, os Peste e Sida (na versão Sanpayo - orgulhosamente só), e os Da Weasel, antes dos UHF, que fecharam as actuações para a entrada dos jogadores em campo, um por um. Festejos absolutos. O estádio cheio - à excepção do anel intermédio de cativos, cadeiras almofadadas, pois claro. As portas estavam abertas a todos. Entrada livre. Viam-se bandos, gangs na real acepção da palavra. Não puxavam pela equipa da casa, mas pela sua: F.C. Amigos do Alheio. Eu estava a tirar fotos com o telemóvel. O Gaspar fazia o mesmo. Senti a presença de meia-dúzia de indivíduos de raça negra que desciam as escadas de acesso às bancadas do primeiro anel, completamente desinteressados do espectáculo dentro das quatro linhas, mas muito atentos a quem fruía descontraidamente aquele momento, em especial aqueles que o tentavam imortalizar numa imagem, recorrendo ao telemóvel. Ia começar a ouvir-se o Piçarra. Pressenti o perigo, guardei o meu telemóvel e virei-me de imediato de costas para o relvado, de frente para o Gaspar, que estava atrás de mim. Nesse segundo, vejo um dos larápios espreitar por cima do ombro do Casper e esticar a mãozinha para lhe surripiar o aparelho. Tive um repente, afastei o malfeitor e alertei o meu amigo, provavelmente com um «Cuidado, Gaspar!» Na confusão dos encontrões, o delicado telemóvel cai por entre um rol de cadeiras à nossa frente. Fizemos barreira com o corpo e os bandidos desceram as escadas de acesso para se quedarem mais abaixo, junto ao relvado, imagino que já premeditando o chocante assalto que perpetraram. Não lhe poderão chamar "invasão de estádio". Essa dá-se ou no jogo em que o campeão se sagra, ou na última partida da época que o campeão jogue na própria casa. Acredito que muitos dos que estragaram a festa não fossem sequer simpatizantes do Benfica. Selvaticamente destruiram vedações, saltearam o campo, os jogadores, a equipa técnica, a direcção, os jornalistas e alguns vips que estariam junto ao palco no centro do terreno, festejando. A festa acabou por aí. Apesar da estupefacção e do assombro dos verdadeiros benfiquistas, da enorme vaia de assobios e do "bruá" ensurdecedor, os pelintras não abandonaram o relvado; pelo contrário. O locutor de serviço tinha a voz embargada em dissabor e, constatando a total falta de benfiquismo dos piratas do estádio, apelava: «O Benfica não merece isto. Portugal não merece isto. A nossa selecção vai jogar em breve neste estádio. Por favor abandonem o relvado.» Nada. O argumento "selecção" também não surtiu efeito. Meia-dúzia de polícias aqui e acoli não mexeram uma palha. Culpa da direcção, que não previu a selvajaria, ou da polícia? Resumindo, o Gaspar ainda ficou com o telemóvel mas não mais conseguiu bater palmas entusiasticamente ou entoar cânticos. Foi-se-lhe o sorriso do rosto. Estava incomodado e já não se sentia em casa, a celebrar entre amigos. Abandonámos o estádio atentos e de mãos nos bolsos. Mesmo assim valeu a pena. Benfica campeão!

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sexta-feira, maio 20, 2005

Amália Rodrigues

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Adaptação para o "Fado Menor"

Os teus olhos estremecem
Em lágrimas que não choro,
Que as lágrimas aliviam
Mas não clareiam os olhos.

Escrevo-te junto à foz
E já vejo o sol posto.
Lágrimas sem a tua voz
Purificam o meu desgosto.

Um barco dizia o teu nome;
Escrevi outro verso por ti:
Sem ti sou meio homem
Ou menos que isso, enfim.

Dizes que já não me queres,
Que nós chegámos ao fim.
Porque é que tu me entristeces?
Porque é que eu te quero assim?

Sabes que aqui te espero
Com as mesmas roupas gastas.
O tempo cura o desespero,
Até lá, que queres que eu faça?

(diminuto / decrescendo)
E quase diria a grande senhora:

(epílogo /crescendo)
Todos os dias te quero,
todos os dias me faltas!

Todos os dias te quero,
todos os dias me faltas!

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A confirmação da portugalidade fadada

O sebastianismo volta a assombrar, pelo mundo dos futebóis, o imo da portugalidade. Como num drama psíquico, o mito e o destino deitam de novo por terra, ou envolvem em brumas, o diáfano vislumbre da vitória, da afirmação incontestável. Calhou ao Sporting. Menos mal. Olha, canta-se o fado!

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Como benfiquista que sou, sem comentários

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quinta-feira, maio 19, 2005

Praça da Tristeza

A Praça da Figueira foi um dos locais privilegiados para que os adeptos pudessem ver num ecrã gigante o jogo da ansiada final em Alvalade. A antecipação da festa começou às 10 horas da manhã, com a transmissão em directo do programa “Praça da Alegria”, que ali assentou arraiais até às 17 horas. Adeptos sportinguistas houve que não arredaram pé desde manhã até ao final do jogo, confraternizando também com alguns russos que, com cachecóis do CSKA, puderam assistir à transmissão pacificamente entre os portugueses. Cheguei-me perto deles e perguntei-lhes de onde eram, ao que responderam prontamente: «Ucrânia, mas nosso clube ser Benfica!» Junto à estátua de D. Pedro I estava todo o aparato técnico da RTP, que começou a ser desmontado minutos após as 22 horas, uma vez que, contra a vontade da maioria dos presentes, os festejos não se prolongaram pela noite. Entre os sportinguistas, a palavra «injustiça» era de ordem. Naturalmente insatisfeitos, os leoninos teciam críticas duras a Ricardo e aos consecutivos «frangos» em jogos cruciais; Pedro Barbosa, por estar «desenquadrado do jogo», e ao treinador Peseiro por ter realizado «substituições tardias». Os russos, serenos, admitindo a superioridade do Sporting na primeira parte, e «alguma sorte» do CSKA na segunda, afirmavam a verdade insofismável de que «o jogo tem 90 minutos, coisa de que os jogadores do Sporting se esqueceram». A Praça, durante todo o dia repleta de alegria e ansiedade, vazou rapidamente no final do jogo com a saída cabisbaixa mas ordeira do público, que se dissipou, então conformado, pelas ruas da Baixa lisboeta. Tal como no final do jogo, em Alvalade, os sportinguistas aplaudiram vencidos e vencedores, o mesmo se observou na Praça da Figueira. De assinalar, portanto, o desportivismo demonstrado numa derrota que fecha uma semana de desilusão para o Sporting.

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quarta-feira, maio 18, 2005

Mas que raio aconteceu a Baby Jane?!

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Nota Autoral 1 - Universo de 1

Publico hoje "Universo de 1", letra de uma das muitas músicas do reportório dos Baby Jane, banda cujo quartel general se situava na Cruz Quebrada. O motivo segue adiante: Foi encetado no passado dia 13 o blog do grupo. Espera-se ainda a adesão dos restantes membros à blogosfera. Aguardam-se verdadeiros desenvolvimentos.

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Universo de 1 (Baby Jane)

Se tudo fosse meu...
O poder de ter o teu e então brincar
No dorso de um animal,
Uma cenoura num fio
Como um telejornal

No mundo visual,
Cor daquilo que se é ou se pertence...
E sem saber, já se tem religião
Como o político que ganhou a eleição

Temos de entrar para poder sair
Partir é chegar e chegar será sempre partir

Se tu pudesses ver
Além daquilo que se pode ter,
Como átomo e electrão...
Pode ser...
Como a terra e o sol,
Ou inverter...
A escala é nossa invenção,
Como dizer?...
Tudo isto é anzol
E tubarão

Temos de entrar para poder sair
Partir é chegar e chegar será sempre partir

Temos de entrar para poder sair
Partir é chegar e chegar será sempre a partir,

Sempre a partir

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terça-feira, maio 17, 2005

"Gare Saint-Lazare", 1877, Claude Monet

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Janine et Marcel à la Gare Saint-Lazare

Janine tinha na lapela do casaco uma rosa esmaecida.
O chapéu elegante, a pena de uma ave ainda viva.
Torcia o sorriso, terminado em duas covinhas.
Marcel, de uniforme, todo aprumado, também sorria.
Por debaixo do bigode, notava-se, oblíquo.
Desce apressado e decidido breves escadas
E salta para o apeadeiro e esquece o comboio.
Abraçam-se longamente.
Janine pare uma lágrima e represa outra:
A da confirmação do tempo impossível.
Contemplam-se a inevitabilidade desfigurados,
Abraçam-se desesperadamente desesperados
E quase se fundem em explosão.
À volta, desaparecera a multidão,
O estrépito e o fragor da estação.
Liquefizeram-se em consubstanciação.
Marcel agarra Janine pelos ombros
Com a mesma força com que combatia;
Com a mesma expressão catártica;
Os sobrolhos engelhados;
Olhos esbugalhados.
Perdera a expressão doce e límpida na guerra,
Viu Janine,
Que ofereceu a Marcel a rosa esmaecida,
E nunca até aqui uma palavra proferida.
- Vai partir. Vou...
Janine desbota,
Engole as palavras que nunca disse.
Sufocara-as cada segundo da sua vida,
Desde o dia em que um mensageiro da morte
Lhe deu a notícia.
Foi em França, no Norte,
Onde ele desembarcou.
Janine casou-se
Três vezes
E em todas as ocasiões,
Na lapela do casaco,
Uma rosa.

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"And Now, For Something Completely Different..." (M. Python)

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segunda-feira, maio 16, 2005

Luís Afonso, Barba e Cabelo

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Luís Afonso, Humor Ardente...

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domingo, maio 15, 2005

Rescaldo de um sábado festivo

Aos 83 minutos de jogo, Luisão, num salto limpo à entrada da pequena área, antecipa os seus 1,92 metros à saída extemporânea e tosca de Ricardo, possivelmente o 4º melhor guarda-redes português. Um toque tão subtil que nem Luisão saberia o que fazia, foi o suficiente para desfeitear o redes sportinguista. Petit bateu o livre que pôs a bola na área leonina, por falta de Pinilla sobre Ricardo Rocha. Ricardo saiu dos postes e falhou o contacto com a bola. Não existe qualquer possibilidade de falta no salto entre ele e Luisão. Nem a inteligência teve de ganhar a falta na pequena área. Bastava que se atirasse para cima do gigante. Este Ricardo é um perigo na baliza de Portugal. Mais um erro crasso seu. Desta vez só custou o título. Um guarda-redes não pode ser um jogador de "engate".
Estavamos na varanda. Os ânimos inflamaram-se assim que Mantorras entrou. E tão tarde! Éramos quase 30 a ver o jogo. A proporção de benfiquistas e sportinguistas equivalia os números estatísticos conhecidos. Estavam lá uns poucos lagartos, que eu bem os vi... Voltando, o Mantorras entra em campo e alguém berra: "Tremam, sportinguistas! Tremam!". Dito e feito. E foi exactamente aos 83 minutos que eu disse ao Semedo: "Agora é que é!". Foi mesmo.
Hoje passou-se o dia de faxina. Limpar, lavar, aspirar, etc. Nada mais por ora. Algum cansaço. O Pinto portou-se muito bem. Pelo menos ainda viu o jogo em condições...

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sexta-feira, maio 13, 2005

19/06/2003 13:20 - L' Espagne et le Portugal - Satellite Terra Posted by Hello

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Conversa da treta entre um benfiquista e um sportinguista - Futurologia Parcial

A noite era ainda uma criança. A uma mesa de café, no Bairro Alto, Zé Gato e Fifi, duas antigas glórias do futebol do Cascalheira F.C., disputavam um campeonato seu, cujas normas estatutárias haviam sido definidas num guardanapo, entre imperiais. Zé Gato, benfiquista inveterado, e Fifi, sportinguista céptico, encontravam-se apenas duas ou três vezes por ano – dependendo do calendário futebolístico – para visionar os embates entre os dois colossos de Lisboa. Em suma, era o futebol que os unia, hoje, no passado e sempre.
- Meu caro amigo, devo dizer-te que já não se joga como antigamente – desabafa Fifi, constatando a superioridade do Benfica.
- Estes gajos correm muito. Às vezes parece que se esquecem da bola.
- D' ”A Bola”? – indaga Fifi que, além de ter dificuldades de audição, tinha-as também de entendimento.
- Sim, da bola, pá. No nosso tempo tínhamos uma coisa em mente: marcar e jogar bonito. Estes tipos são muito físicos. E o Mantorras não sai do banco!
- Mas por que carga de água hão-de eles precisar d’ “A Bola”? Só amanhã, no rescaldo...
Zé Gato olha para Fifi, incrédulo, como quem não se quer entregar ao surrealismo da conversa:
- Está explicado. Se a tua filosofia de jogo tiver paralelo na do teu clube, está evidenciada a cabazada que vocês vão levar hoje no bucho. Já sabes: Pelas nossas contas, cada golo são três imperiais. Já bebi duas e ainda me deves quatro.
Como o leitor terá depreendido, obedecendo a aritmética simples, o Benfica já vencia por dois a zero, decorridos apenas 23 minutos de jogo. E continuava Zé Gato, dirigindo-se, desta feita, ao televisor:
- Mete o Mantorras, pá! Mete o menino! A gente quer é espectáculo.
- Espectáculo... – desvaloriza Fifi – Espectáculo eram os cinco violinos... e o Eusébio, pronto! E não há-de haver outro.
- Nós vivemos esse tempo, mas estes miúdos não sabem nada da vida, de sacrifício, de amor à camisola. Mas tenho uma fé neste Mantorras. Repara: tal como o Eusébio, é dotado de uma velocidade, potência e técnica incomparáveis, acrescendo o facto de saber dar valor ao que tem. Este rapaz jogava descalço na rua, pá!
- Tal como o Eusébio. Lá isso é verdade.
- Este miúdo é uma pérola! E tem bom fundo; é mesmo bom rapaz. E olha que isso é importantíssimo no balneário. Bem diz o Mourinho que não quer pop stars na equipa. Imagina um balneário com cinco Maradonas... ou dois! Era o descalabro - disse, sensaborão, tornando um olhar categórico para o sportinguista: - Sabias que o nome Mantorras lhe foi dado na adolescência, depois de uma vez lhe ter caído em cima uma panela de sopa e ter ficado todo queimadinho? Em Angola, Mantorras quer dizer homem queimado, pá.
- Tu és, de facto, um baú de conhecimento...
- E ficou órfão cedo, aos 15 anos, passando a ser responsável pelos três irmãos mais novos. Isto tem muito que se lhe diga. O nosso menino! - solta Zé Gato, emocionado pela repentina escolha do realizador, que fecha uma câmara no olhar felino de Mantorras, impaciente no banco.
- Mas explica-me cá uma coisa: para que raio precisam eles d’ “A Bola”?
- * -
n.b. - É já amanhã, sábado, que o Campeonato se decide, creio. A atenção de um país inteiro desaguará, à mesma hora, no futebol. Benfica vs Sporting, o Porto e o Braga. 19h45. Dedico a singela antevisão ficcionada ou visionária - amanhã o saberemos - do jogo, passada numa tasquinha de esquina, quiçá no Bairro Alto, Travessa da Queimada ao Alecrim, aos meus prezados camaradas! Um abraço e o diabo a 7 no inferno da Luz!
- * -
Post Scriptum: Uma alma de campeão não se produz. Um espítito ganhador não se treina ou ensina. E não são medalhas que formam o carácter daqueles que nunca venceram, nem tão pouco daqueles que se acostumaram a vencer. Independentemente da ideia criada já perto do final deste Campeonato, de que o campeão por sagrar não o será por mérito próprio mas por demérito dos restantes concorrentes ao título, este Benfica, digo-o com muita pena, não tem fibra de campeão. Simão, Nuno Gomes, Petit e Miguel mereciam ser campeões com a camisola encarnada. Os outros (Moreira, Mantorras, Manuel Fernandes, João Pereira, e Cª) ainda têm tempo para se afirmarem e ajudarem o clube, se não se deixarem seduzir por ofertas milionárias vindas de Itália, Espanha ou Inglaterra. Talvez lá sejam campeões, ou talvez, assim, nunca cheguem a sê-lo. Teriam de trazer a faixa de campeão do lado de dentro da camisola e não de fora. Ricardo Rocha - um jogador que sempre apreciei -, nem o incluo no primeiro grupo de jogadores, até porque há duas épocas que demonstra não ter realizado ainda a dimensão do clube que representa. Recordo que R. Rocha tem esperado, no início e no decorrer das duas épocas transactas, uma oportunidade para jogar em Espanha a todo o custo. Relembro ainda uma afirmação sua, a propósito do suposto interesse da Real Sociedad na sua contratação, na qual afirmava um enorme orgulho pelo interesse demonstrado por essoutro "grande clube".
Nem o facto de, jogando fora, o Benfica ter, por vezes, apoio mais acalorado do público do que na Luz, lança a águia para altos vôos que se traduzam em vitórias e superioridade categórica sobre os seus adversários. O 12º jogador do Benfica - não sendo o Mantorras, que é o 9 - é uma força indomável, dedicada e, como tal, merecedora. O 12 do Benfica enche todos os estádios mas não marca golos, ou já seríamos campeões há muito. Até podíamos pôr os júniores a jogar amanhã, se tudo dependesse dos adeptos. Bem, lads, vamos embora pra cima deles com o que temos! Vamos a eles!, que até os comemos! Só com uma vitória categórica amanhã, num jogo de sonho antológico, esta equipa merece ser campeã. Trap, dois pontas-de-lança de início, por favor! Façam história, rapazes!

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Marte, filho do ciúme e rancor de Juno por Júpiter Posted by Hello

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Escrever é Esquecer (F. Pessoa)

Escrever é esquecer. A literatura é a maneira mais agradável de ignorar a vida. A música embala, as artes visuais animam, as artes vivas (como a dança e a arte de representar) entretêm. A primeira, porém, afasta-se da vida por fazer dela um sono; as segundas, contudo, não se afastam da vida - umas porque usam de fórmulas visíveis e portanto vitais, outras porque vivem da mesma vida humana. Não é o caso da literatura. Essa simula a vida. Um romance é uma história do que nunca foi e um drama é um romance dado sem narrativa. Um poema é a expressão de ideias ou de sentimentos em linguagem que ninguém emprega, pois que ninguém fala em verso.
Fernando Pessoa, in "Livro do Desassossego"

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quinta-feira, maio 12, 2005

Júpiter amamentado por uma cabra, Amalteia Posted by Hello

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NOTA EXPLICATIVA 2 - MARATONA DE MIM EXANGUE EM MÁGOA DESMAMADO, Fecho do Livro Segundo

Pensei seguir caminho mas deparei-me com o promontório de névoa, neblina aos meus pés. Adormeci todo o tempo que não dediquei e todo o outro perdi nas tuas mãos, num copo de Martini; perdi nos teus olhos de menina a minha imagem tão pouco constante, tão pouco retida na tua retina. Perdi-te nos "serões habituais e [n]as conversas sempre iguais", nos "horóscopos, [n]os signos e ascendentes", mais a inútil discussão sobre aquilo que não sentes.
"Não está só a solidão." Ao ouvir a "Canção de Lisboa", descarrilei, mas não tanto. Para escrever não posso ouvir o Jorge, pois, se oiço, deixo-me conduzir. Se pudesse, diria tudo exactamente como ele, o que seria plagiato. Visto que "NOTA EXPLICATIVA" titula este post - que de explicativo não tem nada até ao momento -, concluirei: A solidão, a mágoa, a desilusão, a angústia, a melancolia, a tristeza, o desgosto, a amargura, e, vá, algum saudosismo oracular, fatal e fatalista, são marcas indeléveis na grande parte dos textos (chamar-lhes-ei poemas) publicados desde o fecho daquilo a que chamei "Lohengrin, Livro Primeiro" (26 de Abril, 2005), até agora. Seja a sua coerência anacorética, se outra não se encontrar. Atribuirei também a este segundo conjunto de poemas a denominação de "livro", método estruturante semelhante àquele que etiquetou "Lohengrin". Será este, portanto, o "Livro Segundo". "Maratona de Mim Exangue em Mágoa Desmamado", nomeia. Surgiu rapidamente e é mais cabeçalho do que título, pelo menos a meu ver. Apenas por uma questão de alinho e método optei por "arrumar" este pequeno bloco de textos, filhos localizados de solidão dedicada.

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Obrigação (J. Palma)

"Sim, meu amor, está bem meu amor,
Eu sei que tu tens razão",
Dizia-te eu, às vezes, para acabar
Com a discussão...
E lá íamos vivendo
Entre dois copos e um bom colchão.
Um futuro à nossa frente
E muito amor para mostrar a toda a gente
Como era bom vivermos a dois
Sem nos darmos mal
(uma canção estrangeira e um filme antigo no telejornal).
E uma noite tu disseste:
Já dei p'ra ti meu... vou arrancar!
E lá fiquei eu, sozinho,
A conversar com os meus botões
E a tentar descobrir a causa
Que nos levou a tal situação...
Já achei uma ideia que é bem capaz
De ser a solução:
Acho que nós passámos muito tempo
A misturar tripas com coração,
E a verdade é bem diferente:
Para haver amor, não pode haver o-briga-ção.

- Jorge Palma, in "'Té Já", 1977

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quarta-feira, maio 11, 2005

"Viajante Perante Um Mar de Névoa", 1818, Caspar David Friedrich.
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Uma Vez um Viajante

E além, quem lá vem?,
pela estrada segura, um viajante,
não mais que um homem
talvez destinado, ou talvez à procura,
num passo arrastado, cansado, errante.
Um homem igual, temerário,
segue rumo Norte por estrada segura.
O homem, um viajante,
com destino traçado, passada errante.
Seja o homem passado,
apenas corpo presente;
seja o homem silente,
a fímbria vazante.
De onde vem o viajante?,
que passa tão perto,
no entanto, distante?
Quem será este homem vazio?,
como tanta outra gente,
lançando o anzol ao rio?
Quem será o passageiro ausente,
esperando o destino que dita o tempo,
vagando paciente.
Este homem e esta gente
que passa a vida dormente,
silenciando o corpo,
mas pior, o coração e a mente.
Esta gente que passa
pela estrada segura
e que nunca me abraça,
nunca perdura...
Só há uma vidraça
por onde espreito de fora
e vejo a gente que passa,
e sinto o peso do tempo,
o corpo cansado,
e só tenho agora.
Amanhã levantou-se tarde
o que podes fazer hoje.
E além, quem lá vem?
Um viajante sem emprego,
por entre seus dedos se escapa, foge
o destino ideal, o amor cego,
a areia da ampulheta que ruge
o tempo que falta
no toque fugitivo
do homem sem emprego
que o olhar assalta
apenas o chão, pensativo.
Assim, o viajante passa
pela estrada segura.
Eu espreito pela vidraça,
que sei, um dia será quebrada
pela bola de uma criança
numa vida futura.
Resolvi não sair da carapaça.
O viajante passou consigo próprio.
O tempo passa...
e ele mais distante.
Não discutimos doença
nem procurámos a cura,
e ele, lá longe,
talvez destinado, ou talvez à procura,
um viajante, sem escolha, pela estrada segura,
como eu, um homem!, não mais,
paciente como fruta madura.
Além, quem lá vai?

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terça-feira, maio 10, 2005

"O Grito", 1893, Edvard Munch. Preto e branco. Posted by Hello

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Estou em Dor

Sintoma de doença, tortura.
Inércia que me cansa, amarga doçura...
O sol que ao se pôr me descobre;
a cama que me deita e me soçobra.
Sou tua escuridão cansada e ainda inquieta.
Me camufla e protege na penumbra,
me ensombra e me soletra,
me espreita, do cimo da placa que se encontra na viela.
Sintoma de carência, quase loucura,
esta forma de indecência, amarga doçura...
Teu corpo que se ergue e que eu conheço como nenhum outro,
instante fugaz...
Sou porto que alberga barcaças fatigadas, empurradas a eito por
incertas marés.
Sintoma de demência, mais que loucura,
sobressalto em que me deixas...
Sou poesia, serei todo brandura,
serei todo saudável indecência
em noites passadas que na memória me deixas;
em noites que virão depois de uma noite futura.
Ah! Sintoma de uma vã esperança
de que tu ainda sejas a cura;
que tu ainda sejas a lança
que no meu peito aberto perdura.
Sintoma de doença, loucura,
sobressalto em que me deixas, amarga doçura.

n.b. - Dedico este poema a quem sabe que se lhe destina. Mas não posso deixar de recordar a célebre frase do Bill, "Estou em dor", depois de cair do skate, traduzindo à letra o sentimento imediato de sofrimento, da sua língua nativa para português.
Outra ressalva faço, e esta muy importante: De entre a inspiração patológica e a decorrente dos frémitos platónicos, houve ainda outra origem: Um dos meus irmãos - Tomás -, que escreveu uma música intitulada também "Estou em Dor". Faço-lhe justiça pelo uso do título e envio-lhe da blogosfera um abraço fraterno.

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segunda-feira, maio 09, 2005

Por Debaixo dos Escombros

Ainda há pouco nos amámos
E agora estamos apartados.
Ressoam as palavras que me dizias ao ouvido
Quando me pedias para arvorar os teus sentidos
E me beijavas puxando-me para ti,
Fazendo o que querias de mim.
Ouço as palavras feias que me dizias ao ouvido,
E me agarravas estátua de mármore,
Me lançavas serafim do paraíso
Não sei se para portas do inferno em choro e riso,
Obra-branca-prima de Rodin.
Brinca, puxando-me para ti,
Fazendo o que queres de mim,
Algures nunca no divã.
Dizes que já não me amas.
Terás alguma vez amado?
Tocaste o meu corpo,
Que conheces, e que eu, assim como tu, ignoro,
Sem as nossas almas teres encontrado?
E se eu olhar meigo nos teus olhos,
Que me dirão eles, outrora doces?
E se procurarmos nos destroços,
Não haverá nada de nós os dois?
Toma como certo: Se passarmos p’los escolhos
Temos a praia depois.
E foram tantas provações,
Tantas dores lancinantes,
Tantas impossíveis desilusões,
Que a vida custa a ser vivida,
Daqui e em diante,
E sem ti nada será como dantes,
Como nada o terá alguma vez sido.
Choro, lagrimejo, mas não grito
Como no dia em que tenha nascido.
Não tivesse eu gritado de todo
Para ter de viver no assombro
De não ouvires sequer o que digo;
De não me sentires contigo
A cada segundo que passa.
Nem me assomo da vidraça.
Não me deixo sequer olhar
O sol que nasce, a gente que passa,
Pois tudo é tu no seu estar
E tudo sem ti é só desgraça.
Fecho os olhos e fujo para o meu casulo.
Fecho-me em casa.
Durmo.
Passo o ferrolho da abstinência de lutar
Que sem ti não há causa justa a travar.
Nos meus membros, a vã indolência de cobarde,
Mas paira em mim ainda a inocência
Que crê não haver tempo para ser tarde.
Todas as palavras que escrever
Não serão aquelas que te diria.
Talvez por isso as escreva, talvez um dia...
Talvez descubra que palavras farão a tua alegria.
E sei que me dirás que todas elas são vãs
Como o sol te traz a mim, dolorosamente, todas as manhãs.
Imagino-te a acordar, estremunhada,
Como se visse renascer uma amena alvorada.
Os olhinhos pequeninos,
A pele branca e macia
Onde eu fazia ninhos
E hoje faço nada.
Talvez nunca te descreva...
Ou talvez um dia...
Ressoam palavras que me disseste ao ouvido.
Refulgem dias claros e felizes ao teu lado,
A cabeça no teu ombro,
A tua mão na minha.
Ouve-me por uma vez na vida!
Por debaixo dos escombros,
Vai estar uma menina.
Ela há-de estar ferida
E precisará do teu socorro.

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por Hergé Posted by Hello

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domingo, maio 08, 2005

Já (A. O'Neill)

já não é hoje?
não é aquioje?

já foi ontem
será amanhã?

já quandonde foi?
quandonde será?

eu queria um jázinho que fosse
aquijá
tuoje aquijá.

- Alexandre O'Neill, 1972

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Under the Bridge Posted by Hello

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Debaixo da Ponte

Debaixo da ponte,
onde água não corre,
bebi água da fonte, um chafariz.
Minha centelha padece, morre.
Meu pensamento vai longe,
desde onde o sol me socorre.
Penso grande e fujo,
fazendo-me pequeno, só, e ninguém me acode.
No entanto sereno, dentro de mim chove.
Sou no mar um marujo
e uma imensa tempestade.
Que posso fazer? Renunciar um amor?
Abdicar de ser? Ser insensível à maior dor?
E assim, suspirante e errático, cá estou, dentro de mim,
ao fim da tarde, debaixo da ponte.
E que ponte, afinal!
Mas eras tu a minha fonte,
a minha praia e o meu farol.
Estou de novo com o pensamento em ti
e já nem o sol me socorre.
Só és tu e eu e este sol,
que até ele já me foge.
Começo a perder o seu sentido,
por detrás da ponte.
Já nem o meu astro das coisas certas me aquece.
Uma lua mentirosa desponta.
A lua, essa, será tua.

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sábado, maio 07, 2005

"Os paraísos perdidos estão somente em nós mesmos" (M. Proust)

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Impaciência, solitude, aridez e... mais tempo perdido

Há dois dias que durmo pela noite;
Há duas noites que não vivo,
E hoje vejo-te, ó noite,
Descoberta por um fio de cabelo.
Não tenho sono,
Por isso não me deito.
Sou esponja morna
De vapor rarefeito,
Seja lá isso o que for.
Tudo o que podemos fazer
É intentar e receber
O que for que se nos depare.
Por vezes por um motivo se parte,
Parindo a custo um novo início,
Porque errando se procura a sorte,
E o audaz é feito príncipe.
Hoje não me parece que durma já.
O ambiente é o propício.
Eliminei o monólogo rumoroso da tv.
Temple of the dog no leitor de cd’s.
Tentei escrever sem fazer caso
E talvez sem um ponto de vista;
Uma premissa narrativa,
Para que tudo parecesse ao acaso.
Mas como quem ao vocábulo não resista,
Deixei-me simplesmente ir à deriva
Soltando as palavras
E os sons que nelas vivem.
Mesmo que nada me incomode tanto
Como a desilusão de uma mulher,
Desato a escrever
Algo que outra coisa possa parecer.
Que talvez nada me reste agora,
Descrendo de um novo começo,
Porque não o subscrevo,
Porque me foi cominado,
Porque me foi infligido.
E tudo o resto que se colher
Arrecada-se sem glória
Pois este Verão é tão faustoso
Que o que me deste é sobejo imaturo,
Restos de amor de ti, mulher!
Queria acreditar que se é o que se quiser,
Que por nosso punho escrevemos nossa história,
Mas a história é escrita por quem sai vitorioso.
Um fruto de maduro cai
Em restos de amor de ti, mulher!

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sexta-feira, maio 06, 2005

E esta, hein? Sim, é mesmo ele. Posted by Hello

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Jorge Palma no CCB - Primeira noite, 5ª feira

O grande auditório estava quase repleto. Pessoas de todas as idades compunham a sala. À esquerda do palco, na perspectiva da plateia, o último artista. Todo um espaço que se prolongava por diante, ocupado pelo corpulento piano de cauda preto, dirigia o olhar como uma linha de força de composição estética para a banda. Sob a mesma lógica de perspectiva, da nossa esquerda para a direita, Marco Nunes (guitarrista de Blind Zero), Miguel Barros (baixista de Zen), André Hollanda (também baterista de ZEN) e Miguel Ferreira (teclista de Clã) perfaziam a comitiva de palco desta noite, que também acompanhou o Jorge no seu último álbum, "Norte". Sensivelmente a meio, juntou-se-lhes Vicente Palma, filho de Jorge. Abraçaram-se. Foi bonito. A banda deixou-os a sós. Tocaram guitarra e cantaram lado a lado. Se para fruir e semear a vida há que plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho, este senhor já lá esteve. Já desbundou. Vicente saiu com nova entrada da banda, mas para voltar daí em breve. Desta feita, tocou piano. Ao que sei, é esse o seu instrumento dilecto. Não poderei comentar de todo o início do concerto, essencialmente porque, desta vez, atrasei-me mais do que o próprio Jorge, que chegou "quase" a horas (deve ter sido pr'aí meia-hora de atraso - começava às 21h). O concerto foi bom. Tocou-se um pouco de tudo, com predominância de "Norte". O encore foi generoso. Quando cheguei, o auditório estava muito sossegado e ordeiro, composto simetricamente pelas demasiadamente confortáveis cadeiras almofadadas, apesar de, então, se ouvir "Dormia Tão Sossegada", título que não sugere de todo o andamento da música. Mas tenho algumas saudades do poder, do "muro de som"(*) dos tempos de "Palma's Gang", pelo menos neste formato de "banda". Kalu e Flak - ok, Zé Pedro e Alex também - assentam como uma luva no registo rock, sujo (numa perspectiva um tanto grungie) e impetuoso, mas dinâmico, com espaço para laivos de classicismo e sombras de silêncio, que se ouvem ainda como ecos poderosos que ressoam do inexistente Johnny Guitar. Pensei que, se a oportunidade fosse agarrada com unhas e dentes; alma e coração, os Jimdungo poderiam ter sido banda para dar esse kick de que algum do reportório precisa. Tinham a essência e, arrisco dizer, também a fórmula. Mas o Jorge também é um wandering spirit com um organismo resistente, para quem nem todas as fórmulas fazem sentido. Imprevisibilidade. Também está bem assim, com estes rapazes. O tempo vive-se lentamente. Melhor: O tempo vive-se a seu tempo. O que existe é o presente e não há dois gestos iguais. Interessa é que o Jorge se mantenha feliz, a tocar, e, muito importante, a gravar discos; deixar obra feita. Já hoje, sexta-feira, há mais. De novo no CCB. A música e o preço dos bilhetes são consumer friendly. 10 euros para um fim de dia muito agradável. A companhia também não deixou a desejar.

(*) Wall of Sound: Conceito de Phil Spector, produtor revolucionário da década de 60, que consistia em dobrar determinadas pistas de som (instrumentos ou vozes).

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Vem Como És Posted by Hello
Autor não identificado

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Vem Ver

Meu amor perdido,
vem ver como eu estou bonito.
Meu amor sentido,
vem ver como te admiro.
Vem ver-me nu, para ti,
meu corpo perfeito e sem delito.
Meu amor fugido,
meu amor esvaído dos meus pulsos,
vem ver-me de qualquer forma,
nu ou vestido,
que sou o mesmo eternamente teu,
sem pudor e sem prurido.
Meu amor aflitivo,
torrente incompanhável
de um rio no seu indefectível curso,
que em si não sobrevivo,
se ao teu tronco não me abraço,
se para ti não me debruço.
Sem ti, ao mar não sigo
neste rio tão caudaloso.
Estende-me a tua mão,
dá-me o teu braço,
precipita-te na multidão,
dá-me o teu abraço,
que sou eu, eu mesmo, e não
na multidão qualquer acaso.
Meu amor jamais vencido,
meu amor jamais tomado,
vem ver como te estou rendido,
vem ter-me a teu agrado.
E enquanto tu me esqueces,
para mim não sorrindo,
é o tempo em que te escrevo;
Todo o tempo te dedico.
Nada sentenciando, sublimando,
há esperança talvez zonza, talvez tonta,
em círculos que por ti ando
na bebedeira dos sentidos,
em loucuras que não comando,
por teu amor perdido,
por mim não esquecido,
em mim ablativo,
em mim amputado,
em ti desvanecido.
Vem, meu amor, vem!
Estou como quem nada tem.
Estou pelo teu namoro
ceguinho de choro,
e vou num vai-vem
à velocidade a que te adoro,
buscar-te à indiferença do futuro,
resgatar-te do uivo do passado,
dar-te um presente que esconjuro,
por agora já ter passado.
Vem! Vem para meu lado!
Onde as ruas não têm nome
e os bairros são de amor.
Onde não existe em nós a fome
que alcooliza o rancor,
mas uma fome, sim!, que come,
mas se alimenta de amor.
Perdoa-me, meu amor! Perdoa-me!
E agora, que te disse tudo,
que mais do que isto não consigo,
vou terminar o verso
como quem nada quer disto...

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quinta-feira, maio 05, 2005

Esta é só para não deixar o Jorge Palma em segundo-plano, apesar de o estar mesmo na imagem. O concerto é hoje e amanhã, no CCB. Se alguém mudar de ideias, está convidado. Posted by Hello

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"The bottom line is that when we all plug in, Eddie can make us dance and play like little molecules bouncing off the wall. And, for whatever reason, we can make him feel like singing."

- Stone Gossard, in Musician Magazine, Maio, 1995 -

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Footsteps (Pearl Jam)

Don't even think about reachin' me, I won't be home
Don't even think about stoppin' by, don't think of me at all
I did what I had to do, if there was a reason, it was you...

Don't even think about gettin' inside
Voices in my head, voices
I got scratches, all over my arms
One for each day, since I fell apart
I did what I had to do, if there was a reason, it was you

Footsteps in the hall, it was you, you...
Pictures on my chest, it was you, it was you...

I did what I had to do, and if there was a reason
Oh, there wasn't no reason, no
And if there's something you'd like to do
Just let me continue to blame you

Footsteps in the hall, it was you, you...
Pictures on my chest, it was you, you...


n.b. - Não resisti, por motivos que não determinarei, incluir a letra de "Footsteps", dos Pearl Jam. Bem... posso dizer que estava a ouvir a música. Para aqueles que acompanham a banda há 14, 15 anos - não necessariamente -, é sabido ser, de alguma misteriosa forma, uma música de referência, de um "ecumenismo laico" pouco prolixo, por vezes balbuciante, mas de uma dimensão fraterna, emocional, sincera. O arrebatamento está latente. Melodia, emoção e verdade pairam no ar, amiúde no fecho dos concertos. O mesmo se aplicaria tão bem ou melhor a "Yellow Ledbetter", outro dos (quase) inéditos da banda de Seattle. Mas foi "Footsteps", desta feita, incluído no segundo CD do duplo "Lost Dogs", que transcrevi. "Yellow Ledbetter" fecha o primeiro desta colectânea de inéditos e músicas excedentárias, deixadas de parte, excluídas, por uma ou outra razão, de álbuns. Explicações exaustivas resultam em complicações impeditivas. Ficamos por aqui quanto a esta matéria.
- Pearl Jam e Jorge Palma. Ei-los! PJ & JP -

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Jorge Palma - Hoje e amanhã no CCB Posted by Hello

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Tudo ou Nada

É uma situação exasperante,
Um sentimento explosivo,
E para ti nem é importante;
Nem ouvirás o que te digo
Ou lerás o que te escrevo,
E uma dor que não se sente.
Lugar comum por onde sigo,
Por saber ser esse o mesmo alento;
Ser esse o velho caminho
Por onde os velhos andaram.
Mas é tudo ou nada,
mesmo que tente fugir.
És como Roma: A ti dá toda a estrada,
E eu tento correr e ir.
Mas até onde, se será tudo ou nada,
Na mesma estrada
Onde me prometeste acompanhar
Enquanto dela houvesse para andar.
Disseste que íamos continuar.
Mas mesmo sem ouvir o Palma,
Rendo-me por nem a mim conhecer,
Aquele a quem ultimamente eu quero chegar,
Numa dança monolítica,
Sonolenta e fatigada.
Com tanto por fazer, tanto por realizar.

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quarta-feira, maio 04, 2005

"Sol de Inverno e chuva de Verão não me enganarão" - Provérbio

Posted by Hello

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Inverno

Hoje o mundo está mais pequeno.
As palavras escoaram o sentido das coisas
E os imprudentes intelectualizaram-se.
Captei o teu mais pequeno movimento
Enquanto a mão poisas, não poisas
e deixas voar-te com o vento.
Hoje a solidão deu comigo.

Dedicar-te um poema
Ideia
Tudo se perde
Se transforma
Se emudece
E esquece
Nem a pretensão
Um preciosismo
Apenas as palavras
Quase sem sentido
E –ismo
Solidão
Um tanque profundo
Azul mais escuro
Preto
Um rasgão
O peito
Azedo
Rancor
Perturbação
Amor acre
Mas o teu som é uma canção
O teu passo é uma arte
De uma academia de profissionais
Do poema
Parte
Perde-se
Suspira
Emudece
E esquece-se

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terça-feira, maio 03, 2005

segunda-feira, maio 02, 2005

Verão, pouca roupa, saudade, desdita e muita mágoa

Dei um trago de ti.
Estou cego.
Sabias a mar, estavas salgada.
Era apenas suor.
Cheguei-me perto, toquei-te,
perdi o sentido.
Afastaste-me, brandiste gestos superiores.
Fiquei surdo.
Não consigo ouvir música.
Mas dei um trago de ti.
Embebedei-me quando te vi,
na saliva dos meus temores.
Cego, surdo, mudo, fica da minha mágoa a escrita.
E dei um trago de ti,
que de bebedeira nada senti,
mas reais são os tremores,
por não te ter aqui comigo,
por te tocar não te sentindo.
Ser projectado e magoado pelo zéfiro
da tua incandescência altiva,
brisa sibilina.

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Felicidade é Virtude Posted by Hello

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Virtu

Como uma ponte sobre água agitada,
quero-te para que eu possa ser virtuoso;
para que os meus olhos possam
nos teus se encontrarem
e como irmãos possamos juntar nossas mãos,
como fizeramos, nus, num último reduto do paraíso.
Veio o nosso tempo de brilhar
e trazer as luzes aos nossos sonhos,
dar ao sol o suor dos nossos corpos.
E se precisares apenas de um amigo,
cá hei-de inevitavelmente estar,
para que a tua virtude me guie.

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domingo, maio 01, 2005

Posted by Hello

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A vida é um hábito (S. Beckett)

O hábito é o balastro que prende o cão ao seu vómito. Respirar é um hábito. A vida é um hábito. Ou melhor, a vida é uma sucessão de hábitos, porque o indivíduo é uma sucessão de indivíduos [...] «Hábito» é pois o termo genérico para os inúmeros contratos celebrados entre os inúmeros sujeitos que constituem o indivíduo e os seus inúmeros objectos correlativos. Os períodos de transição que separam as consecutivas adaptações [...] representam as zonas perigosas na vida do indivíduo, perigosas, penosas, misteriosas e férteis, em que, por um momento, o tédio de viver é substituído pelo sofrimento de ser.

Samuel Beckett, in "À Espera de Godot"

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"Escrever é um ócio muito trabalhoso" (J. Goethe)

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"Pushin' Forward Back" - Temple of the Dog Posted by Hello

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